Por uma UCE que organize os estudantes para combater o fascismo em Santa Catarina!

Há cerca de uma década, nosso país se vê ameaçado pelo golpismo, pela escalada das agressões das classes dominantes e pelo crescimento do movimento fascista. Essa conjuntura oferece à juventude e ao povo brasileiro nada mais que fome, miséria, desemprego e carestia. Sofremos uma série de ataques que restringiram o investimento público, a política de valorização do trabalho, a garantia do direito à educação, à saúde e à vida.

A crise estrutural do capital e o desgaste do sistema por suas próprias contradições atingiu nosso povo com força. Em meio à necessidade de aumentar suas taxas de lucro, o imperialismo e as burguesias nativas não hesitaram em atacar o pouco que conquistamos de democracia e soberania nacional. Em nosso país, esse projeto foi marcado pelo golpe à presidenta Dilma em 2016, tendo pontapé com as medidas antipopulares durante seu governo e especialmente de Michel Temer, e alcançando seu auge durante o mandato de Jair Bolsonaro na presidência do país.

Nesse período, sofremos com a perda de direitos históricos: a Reforma Trabalhista acabou com a estabilidade e a segurança dos trabalhadores formais através da legalização do contrato de trabalho intermitente; vimos o congelamento do orçamento da educação, saúde, assistência social e segurança pública por 20 anos pela Emenda Constitucional 95, conhecida como PEC da Morte (PEC241); a Reforma da Previdência veio para destruir nosso serviço de seguridade social, deixando milhares de brasileiros na miséria em proveito dos sistemas previdenciários privados; o Novo Ensino Médio precariza a educação básica e a põe a serviço das necessidades do mercado, de formação de força de trabalho precarizada, ao invés de construção do pensamento crítico.

Em Santa Catarina, vivemos por décadas a continuidade de governos das oligarquias tradicionais, mascaradas pela liderança de aventureiros de última hora como o “bolsonarista-antibolsonarista” Carlos Moisés e o fantoche fascista Jorginho Mello. O primeiro, eleito como figura meteórica de renovação na esteira da eleição nacional, foi completamente cercado pelas oligarquias para que cedesse espaço e comando em seu governo, fazendo mais um governo de continuidade dos tradicionais Pinho Moreira, Bornhausen, Amin, as diversas frações do MDB, Colombo etc. O bombeiro se desgastou com Bolsonaro no início da condução das políticas sobre a pandemia, mas não teve nenhuma outra grande divergência com o presidente. Seu governo foi marcado pela continuidade das políticas de contingenciamento de gastos, a manutenção do estrangulamento dos serviços públicos e migalhas de orçamento que foram distribuídas de forma oportunista para algumas categorias, em especial os professores da rede estadual. Nosso estado, ao contrário da maior parte do país, se manteve fiel ao bolsonarismo e deu uma vitória contundente ao movimento fascista nas eleições de 2022, elegendo um senador praticamente biônico e um governador que se orgulha de ser a vanguarda do que há de mais atrasado na política nacional – provinciano, racista e um lambe-botas do comando fascistizado de parte das classes dominantes.

Durante o governo Bolsonaro, o movimento fascista ganhou estímulos e impulsos fundamentais atacando as moderadas conquistas democráticas da constituição de 1988. Os anos de 2018 a 2022 foram marcados pelo aprofundamento da política racista de segurança pública: operou-se um verdadeiro genocídio contra a população negra e indígena do país; houve o fortalecimento de grupos-paraestatais, como as milícias, que espalham terror nas periferias do país todo; vimos crescer a perseguição aos movimentos sociais por parte de representantes dos três poderes; e pudemos acompanhar a sabotagem a qualquer cuidado com a vida das populações trabalhadoras durante a pandemia. O projeto do fascismo para o Brasil, representando os interesses mais chauvinistas e terroristas do capital financeiro, é criminalizar todo o setor de oposição e liquidar o movimento popular, inclusive através da violência direta e de um regime policialesco, para que seja possível avançar na retirada de direitos do povo – não à toa vimos e vemos tantas manifestações em defesa do AI-5, ataques diretos a organizações políticas, a entidades como a UNE e a UCE, a organizações do movimento camponês e a sindicatos.

Não temos dúvida: não fosse a luta dos estudantes, da juventude e dos trabalhadores, as classes dominantes e o imperialismo poderiam ter acabado com todas as liberdades democráticas, fechado as entidades estudantis e criminalizado completamente a luta política, exterminando qualquer tentativa de luta popular em nosso país no último período. Seria possível que até mesmo as derrotas que tivemos fossem ainda mais profundas, uma vez que também foram impostas derrotas aos golpistas, como na reforma da previdência de Temer e no Future-se. Ainda assim, o projeto fascistizante levou nosso país às mãos de um governo que militava pela morte de centenas de milhares de brasileiros durante a pandemia de COVID-19, além de concretizar a asfixia e desvalorização da educação pública.

Só conseguimos impor uma derrota maior ao imperialismo por conta das forças que acumulamos por meio da luta política e social, nos levando a eleger Lula no pleito à presidência no ano passado. Porém, não podemos acreditar que o governo petista será capaz de assegurar o fim da escalada fascista em nosso país. Não podemos nos enganar! Para liquidar a ameaça fascista, é preciso caminhar para o socialismo, romper os laços de dependência e subordinação econômica do país, prender suas lideranças, desmantelar o núcleo fascista das forças armadas e expulsar a corja burguesa do Brasil! Apesar de simbólica, a vitória contra o golpismo, sete anos depois da derrubada de Dilma, não basta! Precisamos reconstruir a indústria e a economia nacionais, reposicionar nosso país no mapa das nações e dar passos decididos em direção a uma democracia substantiva, que abra caminho para o socialismo.

No entanto, em nosso estado não pudemos conquistar a mesma vitória alcançada no cenário nacional. Tivemos Décio Lima (PT) atingindo uma colocação histórica, chegando no segundo turno da disputa pelo governo catarinense, e representando a parcela de SC que almejava derrotar o fascismo eleitoralmente. Entretanto, é grave que o governador Jorginho Mello (PL) tenha sido eleito com cerca de 70% dos votos, representando a nível estadual o projeto político do bolsonarismo, alinhando-se ainda mais aos interesses fascistas que o governo anterior.

Nos últimos anos, estamos atravessando uma reorganização do centro do poder em Santa Catarina. As antigas oligarquias tradicionais têm perdido espaço para a extrema-direita cada vez mais fascista. Importante lembrar: a fascistização não acontece em desacordo ou em confronto com as oligarquias locais, mas sim pela sua incorporação e explicitação de seus princípios antidemocráticos, pseudo liberais, neoconservadores e protofascistas. Essa guinada para a extrema-direita, potencializada pela polarização eleitoral a nível nacional depois do golpe, se enraizou com sucesso no nosso estado. Santa Catarina tem servido como um ambiente de formação de quadros políticos da extrema-direita para serem alçados a nível nacional. As diferenças regionais e a identidade fraturada no nosso estado, o peso do movimento evangélico de direita e do latinfúndio, a influência nazista histórica, o enfraquecimento e a desarticulação do movimento popular têm representado dificuldades significativas para a superação do refluxo do golpe.

Com essa derrota em Santa Catarina, vimos o projeto de gestão para o estado aprofundar o que vivíamos historicamente, adicionando-se aí uma atuação ativa de Jorginho Mello para minar o governo federal e contrapor qualquer política minimamente mais avançada encampada por Lula. Vemos isso com ênfase na educação, com projetos para manutenção das escolas cívico-militares e a perseguição política de professores. Na educação estadual, ainda, apesar da fragilidade da direção política e construção de trabalho de massas por algumas parcelas dos sindicatos, os professores estão buscando se mobilizar em defesa do concurso público para a categoria, da descompactação da tabela salarial e valorização do vale-alimentação, contra a municipalização do ensino básico e, junto dos demais funcionários do estado, a derrubada do confisco de 14% dos aposentados.

No ensino superior, o governador, junto do secretário de educação Aristides Cimadon (ex-presidente da ACAFE), aprovou o Programa Universidade Gratuita (PUG), um dos carros-chefe de sua campanha eleitoral. O programa destina R$217 milhões dos cofres públicos para as universidades comunitárias e particulares do nosso estado, custeando 28.500 bolsas de estudo com 100% de cobertura no valor da semestralidade dos acadêmicos nessas universidades. Porém, o programa mantém o mesmo percentual de investimento público para a Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), através da mera manutenção das bolsas do Fundo Estadual de Apoio à Manutenção e ao Desenvolvimento do Ensino Superior (FUMDES), com as mesmas características do programa anterior, o UNIEDU (Programa de Bolsas Universitárias de Santa Catarina), que servia para o cumprimento dos artigos 170 e 171 da Constituição Estadual.

Por outro lado, o projeto aprovado a toque de caixa na Assembléia Legislativa, com o apoio da Associação Catarinense das Fundações Educacionais (ACAFE), cria diversos problemas que não estavam presentes no UNIEDU, além de aumentar a participação das universidades particulares – que antes recebiam 10% do investimento público e agora receberão 25%, com o novo programa. O PUG ainda foi aprovado com um programa de transição de apenas um semestre, sendo que seriam necessários pelo menos 3 anos de transição para que os antigos alunos contemplados pelo UNIEDU pudessem concluir sua graduação sem sofrer os ônus que a substituição dos programas gera – anteriormente, havia o requisito do estudante residir no estado a pelo menos 2 anos anteriores ao semestre de solicitação da bolsa; agora, com o PUG, é preciso residir no estado a no mínimo 5 anos prévios ao seu ingresso na universidade.

O que o governador ignora é que Santa Catarina já possui uma universidade gratuita que está presente em nove cidades de nosso estado e que depende exclusivamente do poder público estadual para seu financiamento: a UDESC! Além do PUG, o governo estadual não apresentou nenhum outro projeto ou perspectiva de valorização e investimento extraordinário para a educação de nível superior, deixando claro seu objetivo real de priorizar o Ensino Superior nas universidades comunitárias e particulares ao invés de fortalecer nossa universidade pública estadual.

Dentre as nove cidades de Santa Catarina onde a UDESC possui centros de ensino, sete não possuem Restaurante Universitário e alguns centros não possuem nem mesmo lanchonete. Com um dos valores mais altos do país, a refeição no RU do campus 1 em Florianópolis alcança o valor de R$10,89, isso sem oferecer café da manhã ou refeições aos finais de semana e nas férias, além das poucas vagas ofertadas pelo Programa de Auxílio Financeiro aos Estudantes para subsídio integral da alimentação. Não há moradia estudantil na universidade, mesmo tendo centros de ensino em cidades que possuem os aluguéis mais caros do estado e os metros quadrados mais caros do país, como Florianópolis, Balneário Camboriú e Joinville. Há muito o que melhorar na educação superior pública em Santa Catarina, mas o projeto de Jorginho é agradar as elites e os monopólios da educação e não dar mais oportunidades e qualidade de ensino ao povo catarinense.

Para fechar o pacote do projeto das elites em Santa Catarina, tivemos, nesse primeiro ano de mandato, o descaso com as populações indígenas e do Vale do Itajaí durante as fortes chuvas no mês de outubro que inundaram José Boiteux e sobrecarregaram a barragem do município. O governo não hesitou em descumprir o acordo estabelecido com os povos indígenas da Terra Laklãnõ-Xokleng e utilizou força policial para o fechamento da barragem prestes a transbordar sem garantir atendimento de saúde 24h, barcos para atendimento da comunidade, cestas básicas e a reconstrução das casas em local seguro. Essa situação é exemplo de como Jorginho Mello segue colocando em prática o projeto fascista e colonial de utilizar qualquer recurso, incluindo a opressão a partir da violência direta contra povos marginalizados, para alcançar seus objetivos.

São esses e outros elementos que escancaram o projeto político que está colocado para Santa Catarina. Por mais que tenhamos alcançado uma vitória eleitoral contra o fascismo a nível nacional, precisamos de uma União Catarinense das e dos Estudantes combativa e comprometida em defender as causas dos estudantes e de todo o povo catarinense. É tarefa de todo o movimento estudantil, em especial o catarinense, identificar onde o fascismo se organiza e se manifesta, dentro e fora das nossas escolas e universidades, visando a combatê-lo continuamente e causar sua derrota. Para isso, nossa UCE não pode se resumir a reuniões nos gabinetes dos parlamentares para tentar garantir institucionalmente os interesses dos estudantes e apenas isso: precisamos de uma entidade representativa que também mobilize os estudantes de norte a sul do estado para lutar por nossos direitos e nos ombrear com as lutas de todo o povo, pois somente com muita luta iremos alçar vôos maiores! O próprio programa Universidade Gratuita poderia ser muito mais popular e democratizante do ensino superior se assim a UCE tivesse disputado. Precisamos de uma UCE comprometida com as lutas do nosso povo e do nosso próprio futuro, se colocando firmemente na construção das lutas populares, organizando a categoria estudantil e mobilizando nas ruas junto às massas trabalhadoras para derrotar o fascismo!

Contra o projeto do Capital, lutar e criar a Universidade Popular!

Nas últimas décadas, vimos acontecer a ampliação das vagas e o investimento público nas universidades. Concomitantemente, vimos a expansão e dominação do mercado da educação pelos monopólios privados dos Tubarões da Educação, o aumento da participação das empresas privadas no ensino público, junto da apropriação do conhecimento produzido. Contudo, desde 2015, a luta em defesa das universidades e da educação foi submetida a uma posição de forte defensiva, pois a agenda imperialista e das elites se voltou para a educação básica e superior, causando danos que ainda não deram sinais de reversão substantiva.

No período de maior ascensão do fascismo no país, com seu projeto de educação tecnicista e sem o devido fomento à formação crítica dos estudantes, travamos lutas importantes para impedir os retrocessos. Destacamos a luta contra o projeto Future-se, que abria portas para a privatização das Universidades Federais; a luta pelo duodécimo na UDESC, defendendo o caráter público, estatal e financiado pelo Estado de Santa Catarina em nossa universidade; a luta pelas garantias de acesso à educação de forma emergencial durante a pandemia; e, mais recentemente, a luta contra o Novo Ensino Médio, aprovado a nível nacional e aplicado à risca por Jorginho Mello em nosso estado.

Entendemos que a luta pela revogação total do Novo Ensino Médio segue sendo tarefa prioritária para o Movimento Estudantil. Essa contrarreforma vem para consolidar os interesses dos monopólios na educação básica, retirando significativa carga horária de disciplinas essenciais para a formação crítica do estudante e dando espaço para diferentes itinerários formativos, que, em sua maioria, aprofundam uma ideia utilitarista de educação. Em outras palavras, o Novo Ensino Médio quer preparar estudantes de forma cada vez mais rápida para cumprir tarefas cada vez mais simples exigidas pelo mercado de trabalho. Para os docentes, significa uma precarização ainda maior, obrigando-os a dar aula em diferentes escolas, para incontáveis turmas, para que seja possível completar sua carga horária mínima.

É preciso ter claro que o movimento estudantil universitário deve se colocar ao lado dos professores da educação básica e dos estudantes secundaristas. Travar essa luta não significa apenas defender uma educação básica de qualidade, mas também lutar pela juventude catarinense que precisa de condições dignas para ingressar no ensino superior e acessar a universidade pública. Apenas com o acesso e permanência das camadas populares podemos avançar na construção de uma educação de qualidade que nos permita desenvolver ciência, cultura e tecnologia voltados aos interesses populares. Por isso, é também papel do movimento estudantil universitário lutar pela defesa e melhoria da educação básica brasileira, para que as periferias possam ingressar na universidade e produzir ciência para o povo!

Nas universidades, enfrentamos os resultados de um período em que a expansão do ensino superior aconteceu sem ser acompanhada por um projeto de universidade que tivesse as necessidades do povo em sua base; pelo contrário, sempre foram impostas as necessidades da burguesia. Desta forma, vimos que as classes dominantes brasileiras estão prontas para vender e destruir tudo o que foi conquistado com muita luta pelos estudantes e pelo povo brasileiro.

Dentro das instituições universitárias já havia diversos mecanismos voltados para o mercado, através da capacitação dos futuros trabalhadores para atender suas demandas, utilizando da parceria com empresas, institutos e fundações privadas que buscam alinhar seu projeto de sociedade com o incentivo às pesquisas científicas e práticas de “extensão” na universidade que lhes interessam. Hoje, vemos um aprofundamento da mercadorização das universidades. O que antes era uma necessidade do mercado de se utilizar das universidades para resolver problemas sociais que acometiam os povos marginalizados se apresenta agora com uma total remissão dessas necessidades e priorização de uma educação superior completamente descompromissada com o povo. Os diplomas são praticamente vendidos como água pelas universidades privadas, e, com o amplo avanço do EaD em diversas universidades, o estudante é formado com métodos de ensino cada vez mais precários. São esses os profissionais que as classes dominantes e o mercado capitalista necessitam hoje: trabalhadores técnicos, mecanicistas, praticamente robóticos, alienados pelo seu trabalho cada vez mais precarizado e sem qualquer formação crítica. Dessa maneira, a universidade cumpre seu papel de formadora de força de trabalho para a burguesia, preparando profissionais cada vez mais padronizados às necessidades do capital.

Essa estratégia aplicada pelas classes dominantes nas universidades é grave ameaça para as universidades públicas – que produzem as pesquisas de mais alta qualidade no país e no estado, articulam a produção de conhecimento a serviço da comunidade através da extensão universitária, garantem maiores condições de permanência estudantil em comparação às particulares e melhores condições de trabalho para seus professores e técnicos administrativos. É o que faz com que elas sofram tantos ataques pelo governo federal e estadual com o velho discurso de ineficiência, má administração e “doutrinação comunista”.

Isso acontece pois os interesses do capital e do imperialismo sobre nossa educação vão muito além da mera acumulação de capital através do mercado de diplomas, cursinhos, materiais didáticos e instituições pagas. A educação é um campo de disputas estratégico, no sentido da construção dos consensos políticos, da formação ideológica e da disputa política da sociedade – para além das instituições de ensino superior serem o local privilegiado para a produção de ciência e a produção de quadros dirigentes nas mais diversas esferas para o todo da sociedade.

Por isso,  não devemos desvincular a luta pelo direito à educação, por sua ampliação, popularização e democratização, da disputa de seu conteúdo político e ideológico, libertador e científico! Precisamos pautar um projeto de qual educação e qual universidade desejamos construir, quem devem ser os beneficiados com esse projeto e por quem ele deve ser construído, e para nós isso é claro: nossa luta se entrelaça à estratégia da Universidade Popular como possibilidade de construir uma nova universidade que sirva às necessidades latentes da classe trabalhadora, e não se paute por resolver os problemas do capitalismo e a crise própria desse sistema.

Nesse cenário, é importante percebermos que vivemos uma janela histórica importante: o golpismo e as classes dominantes não conseguiram destruir a universidade pública. Atualmente, há melhores condições de luta para disputar essas instituições, especialmente no aspecto orçamentário. As universidades, no atual governo federal, são respeitadas. Sendo assim, é preciso aprofundar e levar às raízes os verdadeiros problemas da educação, da ciência e da universidade brasileira. Precisamos fortalecer as lutas que apontem para a construção de uma Universidade Popular!

No entanto, a falta de clareza estratégica dos governos petistas e sua base aliada (PCdoB/UJS, PDT/JSPDT e outros), e a crença de que é possível construir o livre desenvolvimento e avanço social dentro do capitalismo, fazem com que o conteúdo das universidades seja dirigido pela burguesia. Em contraposição, em nosso estado a burguesia tem completa liberdade para aplicar seu projeto para as universidade, afinal não é coincidência que o Secretário de Educação, Aristides Cimadon, seja ex-presidente da ACAFE, retratando o modelo de Educação e Universidade que Jorginho Mello planeja para SC, colocando as universidades públicas estatais em segundo plano e valorizando as universidades comunitárias na diretriz de seguirem cumprindo as demandas das elites regionais na formação profissional do povo catarinense.

Hoje as universidade catarinenses são o exemplo prático do que as elites esperam deste campo de disputa. Temos centenas de universidades privadas com ampla formação através do Ensino a Distância e oferecendo cursos rebaixados em troca de um diploma pelo custo que a grande maioria da população tem condições de pagar; temos o forte empresariamento adentrando as universidades públicas e comunitárias, como a presença da WEG e das Fundações de Apoio na UFSC ou da Thomson Reuters na UNESC; tínhamos reitorias alinhadas aos governos liberais catarinense na UDESC, setores retrógrados da universidade alinhados à maçonaria dirigindo historicamente também a reitoria da UFSC; temos a despreocupação das instituições com as condições de permanência dos estudantes, sem priorizar políticas de moradia enquanto a especulação imobiliária engole a renda dos estudantes trabalhadores, além de tantos outros exemplos que podemos encontrar em cada universidade, em cada canto do estado.

Precisamos urgentemente de uma mobilização universitária organizada e dirigida pelas entidades estudantis para ligar as lutas do povo diretamente com os laboratórios, as disciplinas, os campi; com as comunidades acadêmicas em geral! Precisamos construir na sociedade o sentido de valorização e de apropriação popular do espaço da universidade – ampliando sua importância para as classes populares, oferecendo perspectivas de renda, de emprego e de futuro. Não podemos permitir que a UCE fique calada diante do avanço do empreendedorismo e da sanha mercadológica construída em empresas juniores; do rebaixamento político e estratégico desse campo da vida social que é tão caro ao povo trabalhador brasileiro e que precisa se transformar numa trincheira contra os interesses rentistas, imperialistas e parasitas que operam no país.

Para realmente avançarmos, é preciso tomar o problema da educação e da universidade pela raiz. Queremos uma universidade que enfrente a desigualdade, o problema da industrialização e que seja um instrumento estratégico na luta do povo catarinense, contra a agressão imperialista, as imposições dos monopólios e do latifúndio. É hora de sair da defensiva e partir para a ampliação dessa importante trincheira de lutas!

Reconstruir uma entidade de caráter popular, combativo e democrático e derrotar o controle dos partidos na UCE!

A UCE teve sua fundação no ano de 1947, mas sofreu com a desarticulação promovida pela ditadura logo no início de sua organização. Retomou sua força e iniciou sua reorganização apenas em fins da década de 1970, articulada com o reerguimento do DCE Luís Travassos – UFSC, que voltava a ter eleições diretas para sua diretoria. A partir deste momento, nossa entidade estadual de representação dos estudantes teve uma importante e reconhecida atividade na cena política, sendo disputada e construída pelos mais amplos setores democráticos do estado.

Seu reconhecimento histórico é um dos pilares da força da UCE perante a sociedade em geral. Devemos defender a UCE como entidade legítima de representação dos estudantes catarinenses e compreender sua necessidade frente às iniciativas divisionistas de criação de entidades “por decreto” ao invés da sua fundação por necessidade organizativa das bases, e principalmente contra o setor anti-democrático da direita que vem sistematicamente buscando atacar qualquer forma de agremiação do povo em defesa de seus direitos. Defender a UCE perpassa também reconhecer sua potencialidade de apresentar política acertada e consequente que dê direção às necessidades do movimento estudantil catarinense, através de sua possibilidade de inserção em qualquer universidade onde os estudantes estiverem mobilizados ou necessitando de força para iniciar suas mobilizações.

            Porém, apesar do seu histórico e do que poderia ser e fazer, faz tempo que a UCE não é uma entidade reconhecida pela ampla maioria dos estudantes catarinenses. Isso acontece pelos limites do próprio Movimento Estudantil do estado, que não atingiu um nível de organização propício para construir uma entidade estadual massificada, tendo o desafio, ainda, de lidar com a mudança da realidade das universidades em Santa Catarina. Quando a UCE foi criada e em suas primeiras e saudosas décadas, havia cerca de uma dezena e meia de universidades em todo o estado. Assim, era possível que a diretoria da entidade, em poucos dias, conseguisse se fazer presente em todas elas, dialogasse com as diferentes bases e articulasse as lutas principais com todos os estudantes. Agora, são centenas de universidades estado afora, a maioria na rede privada e na modalidade de ensino a distância, o que resulta numa dificuldade ainda maior de consolidar uma entidade geral que conheça a realidade dos estudantes catarinenses e os organize, em todos esses cantos, para a luta.

            Entretanto, o problema de uma UCE distante das bases se agrava pela atuação da União da Juventude Socialista (UJS), organização política que, majoritariamente, dirige e domina a entidade nas últimas décadas. É claro que a política desse grupo para a nossa UCE é construir algumas lutas, preferencialmente a nível institucional e parlamentar, mas principalmente em regiões que são propícias para a autoconstrução da sua própria organização. Essa linha faz com que a UCE seja reconhecida apenas por parlamentares e reitores e não pela grande maioria dos estudantes catarinenses.

Um dos últimos exemplos claros dessa prática foi a defesa pública e rebaixada do programa Universidade Gratuita do governador Jorginho Mello, em que o campo majoritário da direção executiva da entidade encabeçou a posição e se colocou à disposição para conversar com diversos parlamentares da esquerda e também da direita para buscar melhorar o projeto aprovado na ALESC, seguindo a agenda institucional da Assembleia Legislativa (junto do deputado Napoleão Bernardes) e da ACAFE (junto da Profª Drª Luciane Ceretta, reitora da UNESC e presidenta da associação), ao invés de mobilizar os estudantes das universidades comunitárias e da UDESC para defender que o projeto tivesse o maior caráter público possível.

É preciso ter clareza: uma entidade não é um partido, um fórum ou um instrumento do Estado, mas sim um instrumento de organização da categoria, que representa os interesses de seus pares! Assim, devemos construir uma UCE que leve os estudantes à conquista de suas demandas e auxilie no entendimento destes enquanto parte do povo catarinense, ajudando-os a levar adiante seus interesses e a elevar sua consciência política.

Nossa UCE não pode existir em função do crescimento e desenvolvimento de um ou outro partido! A presença de organizações políticas, partidos, tendências, grupos ideológicos etc. no movimento estudantil não é um problema. Pelo contrário, é um sinal de amadurecimento do ME! Um sinal de que os estudantes buscam pensar em sua luta para além da realidade imediata e transitória de serem estudantes e que, ainda, ligam essa condição com as grandes questões da sociedade que fazem parte.

A UCE só poderá dirigir vitórias profundas nas universidades e na sociedade catarinense se colocar os estudantes em movimento para conquistá-las! Vimos os estudantes catarinenses protagonizarem grandes lutas nos últimos anos, como o Tsunami da Educação ou a greve estudantil na UFSC em 2019; enquanto isso, tivemos uma UCE aparelhada e cupulista, refém dos acordos entre os partidos que compõem sua direção e mobilizando ações antidemocráticas, como no Congresso da UCE em 2021, sem eleições de delegados.

O exemplo mais recente do modus operandi que apresenta a forma que os partidos que compõem a direção da UCE utilizam foi o atropelamento do Conselho Estadual de Entidades. O evento, que tem a potencialidade de preparar o debate do CONUCE, definir o regimento deste congresso, trocar experiências entres as diversas entidades de base e propor a política para os CAs e DCEs seguirem até a reunião maior da entidade, acabou sendo realizado de forma online em detrimento da alteração dos dias de encontro do conselho, por conta das fortes tempestades que ocorreram na data marcada, apenas mantendo os interesses de calendário da majoritária. Por fim, tivemos um evento programado inicialmente para ter 2 dias se resumindo à metade de uma tarde, com uma metodologia prejudicial por conta da realização virtual.

Se existe alguma tarefa da UCE que está acima das outras, é justamente a tarefa de dar o exemplo de democracia, de mobilização, de vinculação de uma entidade com suas bases para que sua força seja multiplicada a partir das entidades de base e gerais. A UCE precisa abrigar com transparência e respeito a pluralidade do movimento estudantil e combater as práticas de acordos entre cúpulas, práticas de aparelhamento e de destruição da participação dos estudantes em seu processo de construção. Hoje, neste Congresso, um estudante que não é organizado em alguma juventude ou partido político tem pouca condição de participar dos fóruns de discussão e de deliberação com qualidade, e pouco vai conseguir expressar com qualidade para sua universidade o peso e a dimensão das discussões feitas aqui. Mais do que isso: é possível que sem partidos aliados, este estudante não consiga sequer se credenciar como representante de sua universidade após a eleição na base ou vir até o Congresso como observador. Basta de controle e mandonismo dos partidos na UCE!

Desde quando se promoveu a inversão das datas do CONUNE com a dos congressos das UEEs, vemos a situação de esvaziamento político das entidades estaduais se agravando. Não necessariamente esvaziamento geral de política, mas principalmente no que tange à discussão sobre a realidade específica de nossos estados, e, consequentemente, as respostas do ME para ela. Essa inversão vem acompanhada da perniciosa possibilidade de reciclar delegados do CONUNE para o CONUCE. Entendemos que em algumas universidades essa é uma necessidade plausível, mas, por outro lado, isso gera a situação na qual delegados vão representando suas bases no CONUCE sem terem feito um debate efetivo sobre a situação de Santa Catarina e da UCE com as amplas camadas estudantis, ao passo que nesse processo o fundamental deveria ser analisar e encaminhar os grandes problemas do Brasil e da UNE. Reconhecemos a legitimidade desse modelo, aprovada seguidamente nos CEEs, mas devemos reiterar nossas divergências devido aos efeitos práticos que ele gera, ou, na melhor das hipóteses, das deficiências que acentua.

Colocamos isso pois acreditamos que temos muito a debater sobre Santa Catarina, suas universidades e seu movimento estudantil em específico. Como já colocado, temos um governador alinhado ao movimento fascista que busca aprofundar o programa das classes dominantes em nosso estado; um projeto de financiamento da educação de nível superior que não foi debatido com os estudantes; uma dinâmica de movimento estudantil nova após a pandemia; diferentes padrões regionais de nossa economia que variam do agronegócio à indústria têxtil, metal-mecânica, extrativista, de turismo etc. Precisamos pensar como as universidades e demais instituições podem contribuir para o povo catarinense nos mais diferentes aspectos. Temos muito também a pensar sobre nossa UCE como entidade com história, composição e programas próprios em relação à UNE, ainda que trabalhem conjuntamente.

Nos principais momentos de ascensão do movimento estudantil, e nos momentos mais delicados, a UCE se restringiu a fazer falas públicas e expor seus diretores em demonstração de trabalho, mas não atuou na articulação, unificação e direção do ME catarinense. Isso é latente há anos e não mudou mesmo com o último Congresso da UCE, tendo uma UCE ausente na rearticulação do DCE da UDESC; na construção do III Congresso de Estudantes da UFSC e da própria greve estudantil de 2019; na venda da UNISUL para o grupo empresarial Ânima Educacional; na luta por subsídio no Restaurante Universitário na UDESC; nos casos de racismo, transfobia e nazismo na UFSC e em toda ausência no cotidiano dos estudantes das universidades comunitárias e privadas, se atendo a aparecer na defesa do Programa Universidade Gratuita ou em períodos de eleição de delegados para o Congresso da UNE.

A UCE pouco tem feito, mas pode fazer muito! Nossa entidade já teve também papel fundamental na pressão ao governo estadual contra suas políticas antipopulares, de ataque à juventude, à educação e ao povo em geral. No entanto, faz anos que essa posição foi deixada de lado e vemos uma relação muito próxima da UCE com os espaços de política institucional, adentrando em fóruns do governo partindo do princípio de que se poderia alargar os espaços de disputa dentro da gestão do estado. Por princípio, não se trata de um erro; contudo, ao lidar com governos completamente ligados às oligarquias e com o movimento golpista em nosso país, trata-se de um gesto extremamente irresponsável se colocar desta maneira ao lado dos inimigos do povo. A UCE precisa voltar a ser perigosa para o governo do estado, mobilizar os estudantes para mostrar o peso que podem ter na política local!

Precisamos construir uma União Catarinense das e dos Estudantes que reconheça verdadeiramente as omissões e os erros cometidos pelas diretorias da entidade nos últimos anos. Só desta forma avançaremos na organização e luta dos estudantes, alcançando mudanças práticas e uma política construída com base nos verdadeiros anseios dos estudantes catarinenses. Não há mais espaço para política de gabinete e conciliação com cortes e tubarões do ensino privado! Toda articulação, mesmo a nível institucional, precisa estar subordinada aos objetivos da luta concreta das massas estudantis na base. O oportunismo se pauta por conduzir o movimento de acordo com as agendas institucionais e usar de métodos aparelhistas que subordinam entidades gerais e de base. Não podemos mais aceitar isso! Devemos mover a UCE para seu lugar de origem: o enfrentamento cotidiano e de base, organizando os estudantes e junto deles conquistando vitórias!

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