Semear a primavera entre os canhões: por uma UNE enraizada no cotidiano estudantil e que organize a juventude na luta antifascista!  – Movimento Estudantil

Semear a primavera entre os canhões: por uma UNE enraizada no cotidiano estudantil e que organize a juventude na luta antifascista!  – Movimento Estudantil

Tese de movimento estudantil da Juventude Comunista Avançando

RECONSTRUIR A UNE COMO TRINCHEIRA DE LUTA PELO SOCIALISMO!

A União Nacional dos Estudantes, em seus 88 anos de existência, consagrou-se como uma importante entidade nacional de lutas. Sua história é indissociável da história recente do Brasil, e, particularmente, da história dos de baixo, da nossa gente. Quando a UNE se aproxima e desenvolve as demandas populares e proletárias, reconhecendo as lutas do povo como as suas próprias, é que se consagra como o importante instrumento de lutas que pode ser. Ter em nosso país uma entidade do tamanho da UNE, com a força que tem (e que ainda pode ser maior!), é um patrimônio de valor incalculável para o povo e a juventude brasileira. A UNE é a maior entidade estudantil da América Latina, e pode e deve cumprir um papel fundamental nas lutas populares em direção à verdadeira libertação e independência nacional, rumo ao socialismo.

Na história recente, nas lutas contra o golpe de 2016 e Michel Temer, e contra o governo Bolsonaro, a mudança de conjuntura impôs ao movimento proletário e popular a unidade contra esse candidato fascista para a sua derrota. Apesar das divergências de análises, matizes e prioridades para a conjuntura, o fim de derrotar Bolsonaro; a luta contra a fome, a miséria, o desemprego; a luta por vacina durante a pandemia, eram pontos comuns à esquerda, e desembocaram em grandes manifestações do nosso povo, como foram com as manifestações do Tsunami da Educação em 2019. 

Esses exemplos de luta demonstram os freios que a resistência do nosso povo colocou ao projeto dos monopólios, dos latifúndios e do imperialismo ao nosso país, que desde o golpe não é outro senão o de abrir espaço para uma transformação profunda do Estado e da sociedade, no sentido de impregnar em ambos elementos fascistas e encerrar as parcas liberdades democráticas que ainda restam ao povo brasileiro.  Do contrário, estaríamos todos certamente fadados ao fechamento das nossas entidades de massa, como DCEs, CAs, UEEs e a própria UNE, frente à consolidação de uma ditadura policialesca abertamente fascista no país – o verdadeiro projeto das classes dominantes internas e imperialistas para o Brasil no atual estágio sob a crise estrutural do capital. Também por isso, foi fundamental o forte trabalho construído desde as bases pelas organizações consequentes e por milhares de estudantes independentes, com empenho também da UNE, na defesa da democracia no país.

Contudo, uma unidade entre forças que não convergem em suas prioridades certamente teria limitações importantes. Com a derrota do fascismo nas urnas e a eleição de Lula em 2022, as divergências de análise e prioridade para a conjuntura se ampliaram e demarcaram um Movimento Estudantil cindido nas bases, disputado entre ser um catalisador da mobilização popular sob as melhores condições de luta que conquistamos com o governo Lula versus ser um braço do governo. A direção majoritária da UNE (UJS, Levante, juventudes do PT, JSPDT, JSB, JPL e outras), apesar de palavras de ordem vez ou outra combativas, tem reeditado nos últimos anos o apassivamento da entidade e a aposta na institucionalidade para buscar conquistas parciais, como correia de transmissão da política educacional do governo. É fato que a gestão atual tem apresentado uma agenda mais enérgica, construindo ações abertas pontuais e participado com certa visibilidade do debate público, o que marca um ganho de novas gerações do ME e de alguma disposição que parece haver para alguns enfrentamentos. Um exemplo que saudamos e construímos é o plebiscito popular, organizado pelas frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo, e aprovado também no último CONEB da UNE. Todas as ações que busquem aglutinar o povo em torno das suas pautas mais sentidas e avançar na luta contra o fascismo são importantes. Para nós isso é a construção na prática da frente única proletária contra o fascismo: unidade nas lutas para derrotar o fascismo, nosso principal inimigo, e a defesa do governo ante os ataques fascistas. 

Entretanto, a aposta reiterada na via institucional como saída para a conquista de direitos contrários aos interesses do bloco de poder dominante, que pela sua natureza só podem ser arrancados na luta, acaba por funcionar como um freio de mão imobilista para o conjunto dos estudantes que sentem na pele a piora das condições de vida para a juventude. Essa gestão está marcada pela aprovação do PNAES, por simplórios ganhos de redução da inserção do EaD no ensino presencial e pela realização formalista e ultra esvaziada (de conteúdo político e de participação estudantil) da caravana da Reforma Universitária, aprovada no último CONEB com um sentido reformista, aquém das demandas das universidades brasileiras e da necessidade de disputar essas instituições em seu sentido, orientação e apropriação, para se constituírem como trincheiras das lutas da classe trabalhadora e dos setores populares. Além disso, essa aprovação prescinde de qualquer lastro nas bases dos centros acadêmicos: em muitos estados, a caravana só existiu em palavras; e, naqueles em que ocorreu, foi protocolar e performática, sem profundo envolvimento das bases e discussão democrática e qualificada entre o ME. Também o CONEB, apesar de seu tamanho e de alguns bons debates, pouco conseguiu exprimir das lutas reais nas bases. 

Se a UNE depender do partido que estiver no governo federal para apostar na luta e na mobilização dos estudantes, permaneceremos fadados a repetir uma situação em que ela não poderá cumprir a sua função histórica enquanto entidade de massas estudantil. Respeitando o princípio leninista de democracia, é necessário lutarmos e preservarmos a independência das entidades em relação a governos, partidos políticos e, no caso das entidades estudantis, também de reitorias. A UNE não é um partido, não é um fórum e não é um instrumento de Estado. A União Nacional dos Estudantes é uma entidade estudantil, tal qual são os Centro Acadêmicos, Diretórios Acadêmicos, um DCE ou uma UEE. Por princípio, as entidades representativas do movimento dos setores do nosso povo e da nossa classe precisam ser, por definição, representantes dos interesses de suas categorias – no caso da UNE, dos estudantes. Uma boa entidade não é aquela que existe em função do crescimento e do desenvolvimento de um ou outro partido, e sim aquela que leva os estudantes à luta, auxiliando no entendimento destes enquanto parte do povo brasileiro, ajudando-os a levar adiante seus interesses e a elevar sua consciência.

A presença de organizações políticas, partidos, tendências e outros agrupamentos ideológicos e jornais é um sinal de amadurecimento do ME, sinal de que os estudantes buscam pensar em sua luta para além da realidade imediata e transitória. Ainda, ligam essa condição com as grandes questões nacionais e sociais do país. Posto isso, a experimentação na luta e cada passo inicial de mobilização, construção de uma entidade desde um CA até a participação no CONUNE, trazem elementos significativos para a formação política e a perspectiva de enfrentamento aos desmandos contra o povo. Entretanto, se for limitada a melhorismos dentro da ordem e não conseguir apontar para uma perspectiva mais profunda de transformação da sociedade – e não apenas de conquistas parciais e locais, que são importantes, mas não suficientes –, não será capaz de consolidar um salto de qualidade na orientação e na concretização dessas lutas e das mudanças almejadas. Assim, devemos compreender as entidades para muito além dos setores organizados, tanto em sua construção interna e, sobretudo, no alcance que precisam ter. A presença das organizações não pode confundir os estudantes sobre a finalidade e as formas de organização de suas entidades.

Para serem possíveis vitórias profundas na vida social do país, é necessário que todo o povo esteja em luta! Nos últimos anos, os estudantes têm assumido importante protagonismo, como exemplo na resistência contra os desmandos das elites e a sanha espoliadora dos ricaços, sejam eles os banqueiros, os latifundiários e todo o conjunto de monopolistas locais, sejam os agentes-maiores do imperialismo. No entanto, as decisões e a organização estudantil seguem reféns de acordos de cúpula, práticas de aparelhamento das entidades para servir a interesses partidários e demais ações antidemocráticas. A lógica que tem regrado a vida da entidade é a de um fórum de partidos e organizações, que fatiam o funcionamento da UNE e seus recursos, e se contentam com uma direção política que é a expressão mais frouxa e amorfa de posições rebaixadas e até mesmo de direita que circulam no movimento estudantil.

A divulgação dos regimentos, a convocação dos conselhos intermediários da UNE, o processo eleitoral, a corrida pelas fraudes em universidades sem movimento, o credenciamento, as negociações sobre inscrições e mesmo sobre divisão de delegados… tudo isso e todo o cotidiano do pouco que a entidade faz é atravessado pelo hiper controle partidário, que também carrega uma disputa fratricida entre posições que prejudicam a imagem da entidade nas universidades e que afasta os estudantes da vida democrática do ME.

Hoje, neste Congresso, um estudante que não é organizado em alguma juventude ou partido político não tem qualquer condição de participar dos fóruns de discussão e de deliberação com qualidade, e nem mesmo vai conseguir expressar com qualidade para sua universidade o peso e a dimensão das discussões feitas neste Congresso. Mais do que isso: é possível que, sem organizações aliadas, este estudante não consiga sequer se credenciar como representante de sua universidade após a eleição na base – isso quando consegue espaço para construir uma chapa, fazer sua inscrição e ser eleito, ainda na universidade. O espaço de credenciamento se tornou um palanque para que as próprias organizações meçam forças, sem possibilitar que haja grandes inflexões no debate e na força material que os debates possam fundar nas bases do movimento. Os recursos de fraudes evidentes são registrados quase que apenas formalmente, pois são indiscriminadamente barrados na CNECO, controlada em proporção similar à divisão partidária da diretoria da UNE. Por consequência, o CONUNE, ainda que seja importante, parece ter suas deliberações políticas e linha já definidas no credenciamento, onde cada campo soma crachás e comemora vitórias de antemão.

Não bastasse o histórico antidemocrático na direção da UNE, hegemonizada (e aparelhada) pela UJS, os tempos recentes têm marcado um asfixiamento ainda mais violento da real participação independente e mesmo dos setores organizados. Com pouquíssimas reuniões de diretoria, sobretudo da plena; com a ínfima convocação dos fóruns intermediários; com a ausência de realização de encontros como o ENUNE (de negros, negras e cotistas); com o hipercontrole e a intransigência nas definições da entidade – acumulando a esmagadora maioria das cadeiras e inclusive propondo mudanças eleitorais para que o CONUNE seja ainda menos representativo da realidade do ME presencial –, o campo do imobilismo, que vem ganhando novos adeptos na reorganização política das forças dentro da UNE, é marcado pelo cerceamento à crítica. Os poucos avanços vistos em menores brigas de torcida nos fóruns da UNE, ou de alguma abertura maior para falas de diferentes setores nesses eventos, e até de algumas convocatórias públicas a mais (mas quase apenas performáticas), são positivos e podem vir a demarcar perspectivas de mudança, mas precisam alcançar ainda uma construção verdadeiramente democrática e de livre participação estudantil – inclusive de estudantes independentes.

É se aproximando da classe trabalhadora e das massas populares, dos seus interesses e necessidades, através do conhecimento produzido nas instituições de ensino superior, que forjaremos as condições para que a defesa da universidade seja uma luta de todo o povo, e que as lutas do povo sejam a luta da universidade. Não podemos mais aceitar uma UNE como aparelho político do campo majoritário, que mal coordena a luta na maior parte das universidades brasileiras com movimento real. Essas décadas de aparelhamento, mandonismo e agressão à democracia corroem nossa entidade e a afastam da seiva que a sustenta, fazendo com que tenha sentido em existir: a massa dos estudantes brasileiros. Precisamos de uma UNE que esteja à frente das principais lutas, que tenha agilidade para acompanhar e fomentar cada processo político de interesse dos estudantes, e que caminhe ao lado do conjunto das entidades e do movimento estudantil em geral, para a conquista de vitórias substantivas para nosso povo e para os estudantes brasileiros. 

Essa aproximação das bases precisa se traduzir na própria calibragem do que é o movimento real dos estudantes país afora. Com milhares de protestos e de pessoas organizadas, as greves das federais e em diversas outras instituições em 2024 se viram quase completamente largadas pela UNE – com exceção de um ou outro momento de fala em alguma assembleia, usado como palanque para blindagem de ainda mais críticas de bases que sequer conhecem a entidade, dada sua ausência no cotidiano. A construção representativa e de direção ao que deve ser a luta estudantil foi algo totalmente escanteado pela atual diretoria, o que caminha na contramão da necessidade de ascenso das lutas estudantis como vinculação à reivindicação ainda maior por direitos que nosso povo precisa impor nas ruas. Como nessas lutas das greves ou no impulso mais recente contra a escala 6×1, a juventude se vê cada vez mais sem futuro e sequer com garantias do seu presente, e o desmonte da universidade escancara a violação de nossos direitos em todo o conjunto da sociedade, também.

Hoje, os estudantes universitários são cada vez mais trabalhadores-estudantes, e não simplesmente “estudantes que trabalham”. Soma-se a isso o fato de que, pelo menos nos últimos 5 anos, temos vivido um quadro acelerado de abandono das universidade públicas federais, aumento das taxas de evasão e mesmo da procura pelos cursos. A pandemia, a reprimarização da economia, a desvalorização e o combate feito pelas classes dominantes contra as universidades e a ciência: tudo isso colaborou para o esvaziamento que levou a uma queda das matrículas em diversas universidades públicas do país. Um encerramento de perspectivas de futuro, uma verdadeira expulsão que nos foi imposta.

A disponibilidade de tempo para se dedicar à vida universitária, as prioridades, interesses e necessidades desses trabalhadores-estudantes precisam ser reavaliadas e incorporadas pelo movimento estudantil, que não pode cair no canto da sereia de se vincular aos poderosos, que objetivamente atuam para garantir a manutenção da piora das condições de vida dos estudantes pobres. A aprovação da Lei de Cotas abriu as portas das universidades para os filhos da classe trabalhadora, sendo uma das grandes vitórias do movimento negro e do movimento estudantil nas últimas décadas, e um passo necessário para a ampliação do acesso, como mediação fundamental rumo à sua universalização e ao fim do vestibular. Pintar a universidade de povo é arejá-la e tensioná-la para que se coloque nos trilhos do que pode ser. Não só os professores, as instâncias deliberativas e a própria universidade em seu conjunto têm de se atualizar, mas também o movimento estudantil precisa se reorganizar para ser capaz de dar as melhores respostas às demandas populares que surgem de “dentro” e de “fora” das universidades, avançando nas mobilizações pelas cotas e por políticas de verdadeira assistência e garantia de direitos às parcelas marginalizadas, como mães, Quilombolas, indígenas, trans/travestis e PCDs.

Precisamos, afinal, construir o nosso sentido de disputa da universidade. É dever do movimento estudantil, extrapolando muros e amalgamando forças populares em suas ações, alargar os sentidos e calibrar a universidade à sua função social de atendimento ao nosso povo e construção de um país soberano. Com os exemplos de auto organização de saídas de campo, projetos de extensão, feiras culturais e eventos outros; nas denúncias ao burocratismo institucional, ao fechamento dos campi, às censuras a eventos acadêmicos e à repressão aos movimentos estudantil e popular, que combatemos com séries de debates e protestos estudantis dentro e no entorno das universidades, travamos a disputa da universidade enquanto uma disputa não só da produção de conhecimento, mas também do próprio impacto na cidade e de projeto de país. Travamos a luta por fazer de cada campus uma verdadeira extensão da rua, um território de livre expressão política, artística e cultural; de convívio, de lazer e sob verdadeira segurança de sua comunidade – a partir da circulação aberta, da ocupação dos espaços com gente, iluminação, projetos populares e muita luta, na contramão da ofensiva de “disciplina e ordem” que nos persegue e busca exterminar por todos os cantos. 

A política dos de cima aparece nas universidades de todo o país, além do cerceamento democrático e do controle ou repressão à luta estudantil, através dos subterfúgios da inovação e do empreendedorismo, importada diretamente do Banco Mundial, FMI e tantos outros organismos internacionais que ditam as regras do jogo de acordo com o interesse dos poderosos. Não considerar a política do imperialismo para as universidades em um país de capitalismo dependente leva inegavelmente a erros táticos e estratégicos. Os países que tiveram um desenvolvimento do capitalismo não só desigual e combinado, mas dependente e associado ao imperialismo, têm necessariamente de levar em conta esses interesses para analisar corretamente a luta de classes do país. E isso inclui as universidades. Os nossos inimigos na educação têm projeto para as universidades brasileiras. Eles planejam, elaboram e se inserem nas mais diferentes frentes da universidade; parasitam seu orçamento, infraestrutura, a ciência, tecnologia, cultura e a arte que produzimos. Sem nossa organização e resposta, o ensino, a pesquisa e a extensão ficarão sob as garras de meia dúzia de vende-pátria!

Eles diversificam suas práticas para dominar o que pesquisamos, o que aprendemos e nossos projetos extensionistas. É tarefa urgente da UNE contribuir com as lutas locais em cada uma das universidades discutindo o projeto de universidade que está em jogo. Essa tarefa é grande e complexa, e precisa trazer junto todos aqueles que fazem movimento estudantil nas universidades, seja através dos Centros Acadêmicos, DCEs, grupos de estudos, moradias estudantis, cursinhos populares, projetos de extensão, e todos aqueles que reivindicam melhoras e transformações nas universidades, para que cada uma dessas atividades possam ser articuladas no sentido de acumularem força para fazer frente ao projeto do capital financeiro para as universidades. A UNE precisa tomar nas próprias mãos o debate sobre qual é o ensino, a pesquisa e a extensão que a maior entidade estudantil do país defende: se o conhecimento das universidades vai servir aos interesses dos assentamentos, ocupações, associações de bairro, e aos mais diversos setores das massas populares, e ser orientado para resolver os verdadeiros problemas nacionais, ou se as universidades vão ser parasitadas pelos monopólios, nacionais e internacionais, que garantem a manutenção da fome e da miséria para o nosso povo; se vão seguir produzindo ciência e tecnologia para o agronegócio, que dizima povos tradicionais, florestas e espolia recursos naturais, que perpetua e eleva a novos níveis a violência no campo e por todos os territórios. 

Construir esse caminho, travar essa disputa no cotidiano da entidade, demanda repensar o que têm sido as possibilidades de articulação, diálogo, proposição e efetivação de um programa avançado e de lutas concretas. Assim, a disputa interna da entidade também apresenta desafios consideráveis: frente às mudanças da conjuntura nacional, da realidade da universidade, da precarização da vida da juventude e das práticas desonestas de construção, disputá-la exige compromisso, autocrítica e consequência na eleição do que devem ser as prioridades do ME, mas também em sua efetivação como prática de luta. 

Desde o golpe de 2016, mas sobretudo sob o governo Bolsonaro, foi-se caminhando para uma simplificação nos campos de construção da UNE: a chamada majoritária, com suas práticas danosas de construção interna, suas limitações programáticas maiores e seu apego institucional e reformista; e a oposição, com setores preocupados com a massificação da entidade e da luta estudantil, mas com pouca unidade político–programática, uma aliança mais restrita a eleições e também certas práticas viciadas e negativas por seu patriotismo partidário. A maior mudança que aconteceu desde então já deu sinais no último CONUNE (2023), com aproximações da Juventude Sem Medo (setores do PSOL) ao campo majoritário. 

Podemos avaliar que esse movimento tem a intenção de abrir espaço real para a disputa da UNE: na forma atual da entidade, seria improvável que esse setor ali aprovasse qualquer direcionamento sem estar aliado à UJS – realidade que se reproduz a qualquer outra força, visto que mal há reuniões e consideração das proposições de forças de fora de seu campo. Ainda, é evidente que as teses aprovadas nos espaços deliberativos têm tido política um pouco mais avançada devido à participação da JSM. Entretanto, nenhuma aliança é válida se não constituir táticas de luta que organizem os estudantes e o povo na batalha por seus direitos e por um projeto popular de universidade, o que não vemos acontecendo nessa nova composição que segue priorizando os acordos institucionais e fere a autonomia estudantil, recuando em defender uma outra prática de movimento estudantil. 

Sob alegações difusas de experimentação de uma mudança na cultura política do ME, a JSM tem se omitido ou até encampado movimentações da majoritária para cumprir com o que supõe atender à nova conjuntura, como na defesa de eleições online no ME presencial e apontando a Oposição como ultrapassada. Clama por uma “unidade ampla” que até apresenta conteúdo ao cobrar o governo de que sua “governabilidade” seja a de mobilização nas ruas contra a extrema-direita. Porém, na disputa e mobilização universitária, restringe-se a apontamentos sutis de método e a conteúdos genéricos na ideia de “ganhar os estudantes” e conquistar alguns direitos, sem conseguir (e sequer se propor a) apresentar um robusto projeto de universidade e de ME condizente às tarefas da UNE e da juventude revolucionária.

Assim, entre defesas enérgicas da “nova maioria” e um entrelaçamento já nas tiragens de delegados à majoritária, esse grupo elege também a Oposição como foco de combate ao só criticá-la (e quase apenas ela) e minora as justas críticas sobre o dever da UNE de dar exemplo de construção de luta para podermos ver consecutivas mobilizações de massas nas bases. E o campo do imobilismo, assim, ganha força com tal aliança, silenciosa e conivente ao descaso quanto à maior participação nas/das bases e democracia na UNE, uma vez que a JSM sequer sustenta junto à Oposição pontos centrais como o voto secreto e a maior transparência (financeira, organizativa etc.). No fim, há certo contorno ao legítimo e necessário debate dos males do ME expressos também no âmbito interno da entidade, em nome de “não o reduzir a polêmicas ou infindáveis acusações”, relevando a concretude das fraudes e dos problemas por trás das denúncias, a fim de justificar a aliança recuada.

Com isso, a resposta ainda parece ser lutar pela construção de outra alternativa real de campo, que extrapole o caráter de articulação eleitoral ou para algumas ações e disputas internas na entidade. Ainda que com indefinições no último CONUNE e dificuldades de conformação real até mesmo de um interesse em formar um campo, a oposição avançou na tentativa dessa construção ao longo do último período. Desde espaços unificados antes ou durante os últimos CONEB e CONEG até a composição de chapas conjuntas desde as bases, estreitamos laços na construção real do movimento estudantil Brasil afora entre boa parte das organizações deste campo em reconstrução. Entretanto, ainda precisamos consolidar uma coesão programática que não hesite em colocar como prioridade conjuntural a organização da juventude pela derrubada do fascismo – o que perpassa o posicionamento independente, crítico e de pressão ao governo Lula, mas sua defesa ante as garras imperialistas; que reconheça a importância de uma estratégia de Universidade Popular como guia e horizonte da luta estudantil; e que veja a democracia das entidades estudantis como princípio inegociável, pois uma entidade só se fortalece quando os estudantes se entendem como parte dela, possuindo espaço real para construir sua política. 

Avançar nessa conformação como campo demanda impulsionar a articulação corriqueira e sólida desde as bases, construindo seminários, plenárias, chapas conjuntas e demais espaços de diálogo e proposição de luta, aproximando o conjunto das forças e estudantes na graduação e nos demais segmentos, bem como os puxando em conjunto às lutas todas do movimento popular – entendendo-se como parte deste. Ainda, fomentar uma prática que aproxime estudantes à luta independente de adentrarem o campo, a fim de projetar no cotidiano um trabalho comprometido com a elevação de consciência e a organização popular, bem como de firmar as entidades e cada universidade que alcançarmos como territórios de enfrentamento ao projeto da burguesia.

Junto disso, a democracia na UNE não pode ser tomada como ponto menor ou mera questão de transparência, maior frequência de convocação dos fóruns e algumas mudanças de critérios regimentais. É um grande problema vermos setores da oposição repetindo práticas do campo majoritário e das organizações que extrapolam os dois campos: ora com fratricídio, ora priorizando acordões entre partidos frente à voz das bases nas diferentes universidades, ora sob denúncia de fraude de atas e de eleições fantasmas apenas para medir forças na disputa de delegados para o Congresso, ou de coação e violência. Não iremos resolver o problema da UNE no vale tudo e meramente com número de delegados e autoconstrução partidária, mas sim com uma construção real da entidade, desde as bases, que reflita em um grande número de representantes legitimados pelo corpo estudantil – pautados por uma perspectiva revolucionária em seu programa e organização, sob uma construção honesta, democrática, de ampla e livre participação independente e de unidade real, não eleitoreira. 

Em síntese, é preciso construir um campo de oposição que recupere o sentido da unidade para lutar e o legado histórico de uma UNE que reconheça as lutas do povo como suas. Não podemos incorrer no erro de que já temos um campo pronto apenas porque uma ou outra direção das diferentes organizações construíram consensos mínimos – até porque o que há hoje na Oposição é ainda germinal e precisa ser fortalecido nos termos já expostos. O campo não pertence às organizações, mas deve ser por elas dirigido com o princípio de ser um espaço aglutinador das diferentes lutas estudantis visando a uma nova forma de disputar a UNE, envolvendo as bases e todo o conjunto de independentes que deve ter espaço na entidade, sem hegemonismos, e fazendo avançar o exemplo concreto de debates e ações mais profundas nas universidades e por cada praça e rua deste país. 

Para fazer frente à hegemonia burguesa nas universidades e atacar seus problemas pela raiz, disputando a universidade em seu sentido e orientação, a UNE precisa ser uma mola propulsora da luta estudantil, um polo organizador, que precisa ter uma direção que expresse não só a posição da maioria dos estudantes que lutam no Brasil, mas que os leve adiante, ligando nossas lutas enquanto estudantes a todas as lutas justas do povo brasileiro, fazendo valer a sua tarefa histórica e conduzindo os estudantes em luta pelo socialismo!

Nossos princípios:

  • Por um movimento estudantil democrático e lastreado nas bases!
  • Em defesa da União Nacional dos Estudantes e das entidades estudantis democraticamente constituídas!
  • Por uma universidade popular! Por um movimento estudantil que tenha consciência da importância estratégica da universidade na transformação da sociedade e que lute no sentido de vincular a luta por uma universidade do povo e para o povo com a luta pelo socialismo!
  • Abaixo o aparelhamento das entidades e o patriotismo partidário – pela democratização do CONUNE e por um congresso que verdadeiramente debata o futuro do movimento estudantil!
  • Abaixo as intervenções golpistas nas universidades e institutos federais! Em defesa da democracia e autonomia universitária!
  • Pela livre participação e poder decisório dos estudantes independentes e organizados dentro do movimento estudantil
  • Independência a reitorias e governos

Bandeiras de Luta:

  • Pela exigência de atestados de matrícula, documentos de identificação e assinaturas nas listas de inscrição de chapas e credenciamentos em todos os processos democráticos estudantis – Abaixo a fraude e o vale-tudo na disputa da democracia universitária!
  • Pela reconstrução do movimento estudantil em bases democráticas, com horizonte estratégico em disputa por uma universidade popular desde cada universidade
  • Pela construção aberta das chapas aos congressos e processos eleitorais locais – abaixo o aparelhamento político e as negociatas cupulistas no movimento estudantil!
  • Abaixo as fraudes de C10 e C3, pela ampliação das mesas de credenciamento e os poderes de recurso às entidades gerais. Pela democratização da CNECO, contra o garroteamento da democracia da UNE.
  • Pelo direito ao voto de todos e todas nas chapas e decisões das entidades estudantis
  • Pela convocação semestral de CONEBs e dos fóruns intermediários da UNE! Para reconstruir é preciso mobilizar e fomentar a discussão desde a base do ME.
  • Pelo retorno dos seminários de gestão da UNE, com livre e ampla participação estudantil e garantia do envolvimento do conjunto de entidades e organizações que a constroem!

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