Semear a primavera entre os canhões: por uma UNE enraizada no cotidiano estudantil e que organize a juventude na luta antifascista!  – Educação

Semear a primavera entre os canhões: por uma UNE enraizada no cotidiano estudantil e que organize a juventude na luta antifascista!  – Educação

– Tese de Educação da Juventude Comunista Avançando

O avanço do fascismo no Brasil nos tem legado agudos retrocessos no campo da educação. Na educação básica, os duros anos que enfrentamos de governos golpistas deixaram a herança da contrarreforma do Ensino Médio, consolidada como a primeira ação de Michel Temer. Essa reforma, que não foi substantivamente revogada, esvaziou nossos currículos e é uma violência contra os estudantes filhos e filhas da classe trabalhadora, que estão tendo seu direito a uma educação humana, crítica e criativa negado, haja vista a segregação do conhecimento em itinerários formativos e a exclusão ou redução de grande parte das disciplinas. O Novo Ensino Médio – que nada tem de novidade – não permite futuro à juventude brasileira! Não se trata, entretanto, de uma questão simples de aplicação, mas de um problema de concepção de educação e, por isso, não são “ajustes”, “emendas” ou “reformas” que resolverão o problema do Ensino Médio. A falta de investimentos em infraestrutura, a aglutinação de turmas, a desvalorização dos professores, o constante desrespeito à profissão docente: todos estes elementos são muito mais decisivos para a qualidade e os resultados concretos do acesso da população ao direito à sua própria educação.

A insistência do governo Lula em olhar para essa contrarreforma apenas para propor alterações, não ouvindo a base de professores e estudantes que lutam por sua revogação, é também uma demonstração dos limites desse governo. Apesar de algumas das mudanças trazerem ganhos, como a queda do critério do “notório saber” como suficiente para a contratação dos professores ou o aumento de carga horária da Formação Geral Básica, a revogação imediata do Novo Ensino Médio é fundamental! Defender essa bandeira não é apenas apoiar a luta de docentes e estudantes secundaristas, mas também defender que a juventude tenha condições de ingressar nas universidades públicas, tenha acesso à ciência e à educação com qualidade e dignidade. Por isso, é também papel do movimento estudantil universitário lutar pela defesa e melhoria da educação básica brasileira.

Outro ataque que vivemos devido à ascensão de um projeto fascista para nosso país foi o incentivo à criação de escolas cívico-militares, projeto encabeçado pelo governo Bolsonaro que prometeu novas 54 escolas nesse caráter. Apresentar a escola cívico-militar como o caminho para um futuro promissor da juventude brasileira é concretizar uma concepção de educação preocupada com a reprodução da ordem, com a cristalização do lugar dos militares como garantidores da disciplina e dessa ordem, que reprimam manifestações da liberdade e da diversidade humana que deve habitar a escola – em resumo,  uma forma de educação que amordace os estudantes e professores frente à precarização das nossas próprias vidas e contextos de trabalho. 

A nível federal, o governo Lula encerrou o Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares em agosto de 2023. Entretanto, o incentivo continua em diferentes estados com governadores vinculados ao fascismo, como Jorginho Mello (em Santa Catarina) e Tarcísio de Freitas (em São Paulo). Devemos lutar pelo fim das escolas cívico-militares e por um projeto de país que incentive a educação pública em uma perspectiva emancipadora!

Precisamos frear as investidas de privatização da gestão das escolas básicas. O estado do Paraná está servindo de laboratório para esse projeto, localmente nomeado “Parceiro da Escola”, que prevê a contratação de PJs para atuar na gestão das escolas estaduais, pautando-se por princípios como “eficiência”, “desburocratização” e “elevação dos índices de qualidade”. Na prática, é mais uma vitória das classes dominantes em incutir o silêncio e seus interesses em nossa juventude. Essa mudança diminui cargos públicos, fere o princípio de gestão democrática das escolas e as submete a uma lógica empresarial. Apesar de uma importante greve protagonizada pelo movimento sindical e estudantil do Paraná, o projeto entrou em vigor em 2025. É essencial o envolvimento do ME universitário nessa luta! A lógica de privatização agride todos nós, da educação básica às universidades do país! Educação não é mercadoria!

Em nossas universidades, é inegável que houve alguns avanços desde a eleição de Lula. Sabíamos que essa mudança eleitoral, ainda que insuficiente para derrotar o fascismo, seria uma vitória para nosso povo. Desde 2023, tivemos reajustes nas bolsas de pós-graduação, aprovação do Programa Nacional de Assistência Estudantil (PNAES), ampliação das cotas em diversas universidades federais – especialmente implementação das até então inexistentes cotas trans. Vale frisar que tudo isso foi fruto de muita luta estudantil país afora, em melhores condições de organização também devido à derrota parcial do fascismo nas urnas. 

Ao mesmo tempo que devemos reconhecer esses e outros avanços, também é preciso denunciar que ainda não tivemos uma recomposição orçamentária digna para as IFES, apesar de todo o desmonte do orçamento durante os governos golpistas. O problema orçamentário foi escancarado durante a greve da educação federal de 2024, protagonizada por TAEs, docentes e estudantes de todo o país – à revelia da direção da UNE que, devido ao atrelamento político do setor majoritário ao governo, não construiu a greve. Com todas as suas limitações, esse foi um momento de luta importante que deveria ter sido razão para avanço do governo em ampliação de investimentos e sinalização à comunidade universitária e à juventude brasileira. Apesar do silenciamento frente à greve, o ME colhe frutos de organização estudantil em diversas universidades. A luta por orçamento digno segue sendo central para o ME das federais, num quadro de sucateamento agudo da infraestrutura, das condições de trabalho e estudo, da vivência e circulação da comunidade como um todo – apertando sobretudo para as camadas terceirizadas e estudantes pobres. 

Entretanto, não podemos limitar nossa visão à questão do orçamento e da permanência estudantil. Os problemas que sentimos na pele no dia a dia de qualquer universidade são fruto de um projeto do que podemos chamar de “refuncionalização” das instituições do ensino superior. Esse projeto, na esteira das transformações globais das cadeias produtivas, da desregulamentação do trabalho e da ofensiva fascista, tem tido como pilar o incentivo aos monopólios da educação, a forte implementação do ensino híbrido,  da educação a distância e do eixo de inovação e empreendedorismo como base de produção do conhecimento. Em síntese, trata-se de ampliar ainda mais o domínio do capital e do imperialismo sobre o sistema público de educação e diminuir os espaços para a constituição de ciência, cultura e arte voltadas para os interesses populares e nacionais. 

Primeiro, sobre a questão dos monopólios da educação, temos que ter em mente que, hoje, a educação brasileira é uma das mais mercantilizadas do mundo. O grupo Cogna (antigo Kroton-Anhanguera), por exemplo, controlado por fundos de investimento nacionais e estrangeiros, reúne mais matrículas do que todas as universidades federais somadas. As universidades privadas dominadas por esses grupos são apresentadas como único caminho possível para a classe trabalhadora ter acesso ao ensino superior. Com isso, não só se simplifica nossa formação pensando apenas em um preparo mínimo para adentrar um mundo do trabalho cada vez mais precarizado, como também se prioriza a geração de lucros para estes monopólios. 

A situação fica ainda mais grave pelo fomento de programas públicos (PROUNI e FIES, além de iniciativas estaduais) que beneficiam esses monopólios, também se desresponsabilizando da garantia de uma educação superior efetivamente pública para todos. A existência de subsídios e facilitação do acesso à educação superior através de instituições privadas é compreensível, na medida que é aplicada de forma tática e paliativa, para possibilitar o acesso ao direito à população. No entanto, estes programas de fomento não se configuram mais como ferramentas de transição ou complementares: eles são hoje os principais responsáveis pela formação superior no Brasil, sem qualquer previsão de que percam sua relevância no sistema de educação. FIES e PROUNI deveriam ser programas de transição, políticas temporárias que permitissem o acesso à educação enquanto o Estado brasileiro ainda não possuísse condições para oferecer ensino público, gratuito, estatal e de qualidade para a ampla massa do povo. A UNE deve lutar para que esses programas e outros afins tenham essa finalidade! Queremos acesso e permanência a uma educação pública, gratuita, estatal, de qualidade e emancipadora para todo nosso povo! 

No momento de crise estrutural do Capital que vivemos, também os monopólios da educação sentem a queda das taxas de lucro. Qual tem sido, então, a postura dessas corporações para lidar com a diminuição dos ganhos? Demissões em massa, precarização das já debilitadas universidades privadas, investimento em novos nichos de mercado (editoração de materiais didáticos, educação básica etc.) e, principalmente, ampliação dos cursos de graduação a distância (EaD). A expansão desta modalidade por parte das instituições privadas com fins lucrativos gerou, entre 2018 e 2022, um aumento de quase 200% no número de matrículas. Além disso, com a autorização do MEC de que até 40% dos cursos possa ser ofertado por EaD, a tendência é de que haja uma reconfiguração educacional em diversos níveis, com o aumento sem precedentes da exploração do trabalho docente (já que, assim, um número muito pequeno de professores pode dar aula para milhares de estudantes), problemas éticos em relação à apropriação do trabalho docente, precarização e rebaixamento da formação e das condições de ensino e pesquisa, entre outras consequências sérias. 

Mais especificamente sobre as universidades públicas, o mecanismo perverso da refuncionalização opera mais ou menos dessa forma: os governos cortam ou reduzem enormemente a verba destinada à educação de nível superior e, paralelamente, incentivam a sobrevivência dos laboratórios de pesquisa, dos centros de pesquisa e das instituições como um todo através da “captação de recursos externos”, ou seja, da oferta da estrutura pública para o parasitismo da iniciativa privada, como um segmento de serviços utilitaristas.

É essa a lógica que incentiva também a consolidação da inovação-empreendedorismo como pilar da universidade. Essa priorização de serviços utilitaristas, atravessados também pelo fomento ao empreendedorismo, vem inclusive ferindo o caráter público das instituições federais. É esse o caso da USP, que cede recursos humanos e materiais para as corporações poderem utilizar livremente. Esse tipo de relação é uma das marcas das relações desiguais provocadas pela dependência e as estruturas de dominação autocráticas e capitalistas. Um exemplo bastante ilustrativo é a relação de Paulo Guedes, ex-Ministro da Fazenda de Bolsonaro, que operava diretamente no setor de fundos em grupos que lideram o setor mercantil educacional (HSM Educacional S.A, BR Educacional, Gaec Educação, Bozano Investimentos). Além disso, uma das principais dirigentes da Associação Brasileira para o Desenvolvimento da Educação Superior e da Associação Nacional das Universidades Privadas era sua irmã, Elizabeth Guedes. Talvez um dos casos mais gritantes seja mesmo da Universidade de São Paulo, em que além da inovação-empreendedorismo ter sido incluída no agora “quadripé” universitário (ao lado de ensino, pesquisa e extensão), o banco BTG Pactual, vinculado a Paulo Guedes, abriu uma faculdade privada dentro da USP, utilizando seus recursos humanos e materiais em uma relação parasitária como a que nos referimos anteriormente.

Este afã pelo “empreendedorismo” vem se apresentando pelas classes dominantes como a solução para se adaptar à condição de precarização do trabalho no discurso público e também no interior das universidades. A UDESC (Universidade do Estado de Santa Catarina) vem debatendo a construção de uma “política de empreendedorismo”, com objetivo previsto de “fomentar o empreendedorismo universitário, impulsionar a inovação e fortalecer o desenvolvimento econômico e social do Estado de Santa Catarina”. Além do incentivo ao “perfil empreendedor” dos estudantes, conta com mecanismos que permitirão que empresas privadas mandem seus problemas para os estudantes da UDESC proporem soluções, utilizando da infraestrutura e da força de trabalho não-paga de uma universidade pública. Este é mais um exemplo evidente de submissão da universidade pública aos interesses privados. 

Nesse cenário, reforçamos a importância de disputar o conhecimento que é produzido pela universidade. A implementação do empreendedorismo quase que como parte do tripé universitário, a simplificação das formações, a censura promovida por governadores a pesquisas que debatam novos rumos para a sociedade – a exemplo do que Jorginho Mello fez em SC, barrando bolsas para pesquisas que discutiriam temas como gênero, sexualiadade e movimentos sociais – são apenas algumas das evidências de que a burguesia nos ataca para manter a universidade em prol de seu interesse. 

Entretanto, a universidade segue sendo uma instituição-chave para a nossa sociedade e também disputável por nós. Ela tem capacidade de produzir conhecimento, arte e tecnologia de forma relativamente autônoma, sendo tão moldada pela ordem capitalista quanto pelas forças que buscam sua superação. Por isso, a luta do Movimento Estudantil deve pautar uma estratégia, um novo projeto de universidade: a Universidade Popular! Pautar e efetivar a possibilidade de que a universidade, por suas características ímpares, contribua para a formação de um bloco de todos aqueles que têm seus interesses atravessados pelas garras dos que estão no poder. A universidade pode ser uma trincheira de lutas, onde a produção de conhecimento, o ensino, a pesquisa e a extensão, podem estar a serviço das lutas do povo contra suas verdadeiras mazelas – a fome, a miséria, o desemprego, a desigualdade, a falta de habitação, de saneamento, de espaços de cultura, de saúde etc.

Um dos debates aventados na UNE no último período tem sido uma possível proposta de Reforma Universitária. Com a má construção das caravanas universitárias e a inexistência de debate de Reforma nas bases do ME, não vemos qualquer conteúdo efetivamente proletário e popular nessa discussão. A proposta não abarca as reais necessidades de ampliação das instituições, apenas timidamente no que tange o seu acesso e a recomposição orçamentária.  Em nome de uma agitação pela Reforma Universitária, no vazio da palavra, os setores que a defendem dessa forma acabam também absorvendo as reivindicações por “inovação”, “empreendedorismo”, e o fortalecimento da vinculação da universidade com os interesses do bloco dominante. Reforçamos: a luta por direito a acesso e permanência no ensino superior precisa andar junto com uma disputa que coloque a universidade a serviço do povo brasileiro! 

Nossos princípios:

  • Educação não é mercadoria! Abaixo a simplificação e o sucateamento da educação pública! Pelo fim consequente do FIES, pela estatização das universidades privadas, comunitárias e filantrópicas que vivem de dinheiro público!
  • Educação é direito e é para formar humanamente, de forma crítica e consciente! Abaixo a instrumentalização empresarial da educação! 
  • Educação é cultura, lazer, ciência e arte! Abaixo a simplificação da educação como preparação para o mercado de trabalho!
  • Educação humanista e para a liberdade! Pela valorização das ciências humanas e naturais como parte da formação integral no ensino básico!
  • Abaixo a militarização das escolas e universidades! Lugar de militar é no quartel!
  • Em defesa da universidade pública, gratuita, laica, estatal e de qualidade, em luta pela Universidade Popular! Ensino superior como direito real a todos!
  • Pela disputa do sentido da universidade: produzir ciência, cultura e arte para resolver os principais problemas nacionais! Por uma universidade que seja uma trincheira das principais lutas do povo brasileiro em direção ao socialismo!
  • Por democracia e autonomia na gestão das escolas e universidades!
  • Abaixo a ideologia do empreendedorismo nas escolas e universidades!
  • Pelo fim do vestibular e pelo acesso universal! Todas e todos devem ter o direito de acessar o conhecimento!

Nossas bandeiras de luta:

  • Em defesa das cotas raciais, trans, para PCDs e o conjunto de ações afirmativas sociais, em seu aprimoramento, ampliação e transformação das instituições de ensino!
  • Voto universal para as gestões na educação! Pelo fim das listas tríplices e a indicação dos reitores e diretores de escolas! Os gestores têm de ser representantes das comunidades acadêmicas!
  • Abaixo o empreendedorismo e a falsa inovação! Contra as ilusões rentistas e parasitárias do Capital na educação!
  • Em defesa da extensão popular e da ligação da universidade com as lutas do povo brasileiro!
  • Pela ampliação das condições de permanência e assistência aos estudantes!
  • Pela ampliação da universidade pública e estatal brasileira!

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