EM DEFESA DA VIDA DA CLASSE TRABALHADORA: DERRUBAR BOLSONARO E CONSTRUIR UMA SAÍDA POPULAR PARA A CRISE
*Nota conjunta PCLCP E JCA
Em pouco mais de um mês da chegada do Coronavírus ao Brasil, o país já apresenta um quadro epidemiológico muito alarmante, inclusive se comparado com a evolução dos casos nos países mais afetados, como a Itália. São mais de 5717 casos confirmados, outras milhares de internações hospitalares ainda sem teste e já ultrapassamos a marca de 200 mortos. Ainda não chegamos ao pico do processo de contaminação, o que torna este momento decisivo para tomar medidas de prevenção e controle. Segundo estudo recente de cientistas ligados ao Imperial College de Londres e a Organização Mundial da Saúde – OMS, o Brasil poderá chegar a mais de 1 milhão de mortos se abandonar a quarentena e tratar a Covid-19 como “uma gripezinha qualquer”.
Conforme o número de casos do novo Coronavírus crescem pelo Brasil, os posicionamentos do governo Bolsonaro nos encaminham para um cenário calamitoso. O presidente tem ignorado as recomendações feitas pelas autoridades mundiais de saúde e pelas autoridades e entidades científicas brasileiras, diante do cenário que já vivem outros países até hoje (01/04), como EUA, com 3.416 mortos (175 mil casos confirmados), Espanha, com 8.189 mortos (94,4 mil casos confirmados), Irã, com 2.898 mortos (mais de 44 mil casos confirmados) e Itália, com mais de 11 mil mortos. Já são mais de 40 mil mortos na soma de todos os países, com 803 mil pessoas infectadas pela doença, sendo que a maioria dos países nem chegou no pico do número de casos. Enquanto o mundo adota medidas de isolamento social, Bolsonaro defende em seus pronunciamentos oficiais o fim da quarentena e a defesa irrestrita do capital ao custo das vidas do povo brasileiro.
Nos últimos dias, temos visto o presidente combater a ciência, inclusive com o anúncio do corte de centenas de bolsas de pós-graduação, e contradizer as declarações de seu próprio ministro da saúde. A postura de Bolsonaro gerou atrito político no seio da elites brasileiras, isolando o presidente dos governadores estaduais e do Congresso Nacional. As críticas de especialistas de saúde, políticos da direita tradicional e de ex-apoiadores foram repetidas no horário nobre dos telejornais, acompanhadas de panelaços por todo país. Diante desse cenário, surgiram especulações sobre a queda de Bolsonaro articulada pela direita tradicional no parlamento, uma vez que a esquerda, sem poder tomar as ruas, tem dificuldades para articular ações contundentes nesse momento. Entretanto, as diferenças e disputas entre a extrema direita bolsonarista e a direita tradicional são profundas o suficiente para que esse confronto produza uma mudança na direção do Estado brasileiro?
É importante lembrar que Bolsonaro é resultado e continuação do golpe de 2016, apoiado e alimentado pelos monopólios e pelo latifúndio, representados nos partidos, gabinetes e na grande mídia oportunista. O golpe arquitetado “com STF, com tudo” teve adesão dessa direita tradicional, assanhada com a possibilidade de retornar ao comando do executivo com uma candidatura puro sangue. Contudo, o elemento dirigente desse processo é o imperialismo dos EUA. O movimento golpista foi impulsionado, desde 2013, por “novos atores políticos” como o MBL, Vem Pra Rua e outros fantoches dos monopólios estadunidenses, bem como por um discurso extremista contra os partidos e outras instituições. O ambiente político gerado nesse processo era propício a uma candidatura extremista de um outsider como Bolsonaro, ou seja, um candidato que era oposição ao PT e, ao mesmo tempo, não era uma figurinha repetida da direita tradicional. Além do trabalho prévio, teve um peso decisivo o uso das tecnologias de manipulação de massa através das redes sociais, articulado pelo fascista Steve Bannon. O péssimo resultado eleitoral da direita tradicional não se responde apenas pelo péssimo candidato Geraldo – picolé de chuchu – Alckmin, mas também por um enfraquecimento geral de todo esse setor. No Congresso Nacional, houve recuo de todos os principais partidos da direita tradicional no número de deputados e senadores eleitos em 2018, com exceção apenas do DEM.
O golpe unificou a direita em torno de um programa de privatizações, retirada de direitos e entrega do patrimônio nacional. Por essa razão, até o momento, as divergências entre bolsonaristas e membros da direita tradicional se apresentaram apenas na chamada “pauta dos costumes”. Quando a política econômica entra em debate, a disputa gira em torno de provar quem é mais eficiente na aprovação das reformas, Congresso ou Executivo. Entretanto, há consenso no ataque à nova república, expresso na destruição da Constituição de 1988, especialmente no que tange aos direitos do povo. A diferença entre essas frações burguesas está, sobretudo, no projeto político extremista de Bolsonaro, que anuncia e trabalha “em aproximações sucessivas” por um golpe dentro do golpe, enquanto a direita tradicional busca preservar sua hegemonia dentro das instâncias de Estado democráticas burguesas existentes.
A disputa travada pela direita tradicional contra Bolsonaro é uma disputa por espaço da estrutura de Estado e na condução do programa do golpe. Bolsonaro age completamente alinhado aos interesses dos EUA, ao exemplo de seu retorno ao Brasil, após jantar com Trump, quando radicalizou a convocação das manifestações do dia 15 de março, proclamando o fechamento do Congresso. Os planos dos EUA para as grandes disputas da geopolítica mundial envolvem o acesso irrestrito às riquezas do Brasil. Pouco importam à potência imperialista nossa produção industrial, o mercado interno e os níveis de vida do povo brasileiro. Para os EUA, o petróleo, a água, as terras, os minérios, a biodiversidade e a posição do Brasil no continente oferecem reservas de recursos fundamentais e garantias de super lucro, já que o país conta com a infraestrutura necessária para extração dessas riquezas. Dentro dessa lógica, a desvalorização da Petrobrás e a quebradeira da economia viram liquidação, e o caos político justificativa para que o presidente assuma plenos poderes sobre a nação.
A direita tradicional representa setores das classes dominantes ligados ao mercado interno, monopólios associados e submetidos ao capital estadunidense, mas cujo lucro depende da economia doméstica. Essa fração burguesa não tem projeto próprio, nem intenções de romper com os sócios majoritários do norte, ao contrário, esperam ansiosos pelo aprofundamento do seu vínculo com o capital financeiro e por sua parte na liquidação das riquezas nacionais, mesmo sabendo que isso implica na destruição de vários ramos da economia brasileira, como têm demonstrado os dados sobre crescimento econômico, desemprego, retração da produção industrial e super valorização do dólar. Esses setores das classes dominantes estão impacientes com a condução de Bolsonaro, pois as reformas e privatizações, que serviriam de compensação pelos prejuízos no mercado interno, não estão sendo entregues no ritmo desejado. A aprovação das medidas econômicas é constantemente adiada em favor da disputa em torno do projeto fascista de golpe dentro do golpe. Isso tem levado o presidente a combates ideológicos contra China, povos árabes e outros parceiros comerciais importantes, e a choques constantes contra o Congresso.
Num momento de crise econômica mundial, agravada pela pandemia, as contradições se agudizam pelo pavor da burguesia com a queda do lucro. Os monopólios, o latifúndio e os bancos certamente têm trabalhado nos últimos dias para selar acordos espúrios em reuniões reservadas, tanto com o Congresso, quanto com o presidente, com o objetivo de garantir os recursos do Estado para salvarem seus negócios. As alfinetadas que observamos na mídia, nas declarações de Bolsonaro, Rodrigo Maia e dos diversos governadores são dirigidas à disputa da população em geral (estamos em ano eleitoral), e da grande massa de pequenos e microempresários espalhados pelo país. Enquanto o Congresso debatia e preparava medidas para socorrer o capital e fornecer mínima assistência para parte da população mais pobre, Bolsonaro saiu na frente na defesa incondicional do capital, defendendo o fim da quarentena, custe quantas vidas custar. As ordas do bolsonarismo foram ativadas, as posições do presidente, manifestos públicos de empresários e carreatas fizeram ao menos três governadores recuarem (MT, RO e SC), ainda que o governador catarinense já tenha desistido de sair da quarentena.
Não podemos esquecer do consenso da direita quanto ao programa econômico do golpe. Metade dos/das trabalhadores/as já são forçados/as a se expor à doença e infecção para poder sobreviver, devido a sua condição de informalidade, sempre presente em nosso país, mas especialmente induzida pela Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017) e pela Lei das Terceirizações (Lei 13.429/2017). O sistema de saúde irá colapsar, e a crise sanitária e suas consequências nos próximos anos não serão resolvidas enquanto perdurar a Emenda Constitucional 95, do teto de investimentos públicos.
A realidade do contágio tende a se impor contra o discurso genocida de Bolsonaro, tal qual aconteceu na cidade italiana de Milão. Mas que preço o povo brasileiro terá que pagar? A direita tradicional participou ativamente do golpe e atua pela destruição da Nova República. Se impõe alguns empecilhos ao avanço fascista de Bolsonaro, não tem um projeto político próprio que dispute com os interesses dos EUA. Está buscando unificar o capital através de importantes monopólios da mídia, como o grupo Globo, e da gestão de parte dos recursos da União, aprovando pacotes de socorro ao capital, mas não é capaz de conformar base social de massa e, ao que tudo indica, não tem bases sólidas no comando das Forças Armadas. Ainda que Bolsonaro fique apagado na gestão efetiva da crise do Coronavírus, sua queda articulada pelo Congresso é improvável, pois implicaria em desafiar os EUA e, o que é mais importante, a derrota de seu programa, o que não é objetivo da burguesia.
Nesse momento, as forças populares são as únicas interessadas em derrotar Bolsonaro e, ao mesmo tempo, seu programa de destruição nacional, uma vez que este é encampado também pelo Congresso e pela direita tradicional. A precarização da vida do povo é também a precarização das lutas populares, é necessário que os trabalhadores e trabalhadoras tenham condições mínimas de sobrevivência antes de tudo. Nesse momento, com a pandemia se espalhando especialmente entre as camadas mais fragilizadas da sociedade, que já sofrem com falta de saneamento básico, condições de moradia dignas e acesso à saúde de qualidade, é urgente a defesa da vida dos/das trabalhadores/as. Precisamos defender a manutenção da quarentena, com garantia legal de estabilidade do emprego durante todo o período, amparando trabalhadores/as – assalariados/as e autônomos/as – e desempregados.
É necessária a intervenção estatal para socorrer as micro e pequenas empresas, que representam mais da metade das vagas formais de emprego (57%), segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério da Economia, em 2019. Essas empresas foram responsáveis por 75% das novas contratações realizadas no ano passado, cerca de 670 mil empregos. A defesa dessas empresas vai na contramão do que faz o governo e o grande capital, que têm priorizado a manutenção das taxas de lucro dos monopólios e bancos.
Aliado a essa medida, deve-se aplicar o imposto sobre grandes fortunas – previsto na constituição e nunca executado – e taxar os bancos privados, cobrando percentual de seus lucros referentes a 2019. O dinheiro deve ser direcionado ao financiamento exclusivo do SUS e das pesquisas referentes ao enfrentamento do Coronavírus, e o Estado deve garantir a aquisição imediata de EPIs e equipamentos indispensáveis para o enfrentamento da pandemia. Ademais, o Estado também deve garantir o desenvolvimento da capacidade de produzir esses materiais dentro do próprio país, com vistas a se tornar autossuficiente, além de contratar profissionais da saúde, melhorando as condições de trabalho dos profissionais que hoje enfrentam intermináveis plantões, em nível de esgotamento físico e emocional.
É necessária a revogação imediata da EC 95 e a suspensão do pagamento e realização de auditoria da dívida pública, que toma mais de 1 trilhão de reais do orçamento público federal todos os anos, recursos que, segundo a Auditoria Cidadã da Dívida Pública, “[…] se encontram reservados apenas para o pagamento de uma questionável dívida que nunca foi integralmente auditada, em benefício de um sistema financeiro que se nega a cumprir suas funções constitucionais […] como consta do art. 192 da Constituição Federal”.
Bolsonaro já deixou claro qual a prioridade do seu governo nesse momento: favorecer o grande capital financeiro, nem que para isso precise instaurar num novo golpe, abertamente fascista. Essa pandemia evidencia que é a classe trabalhadora quem produz a riqueza e move o mundo. Nesse momento de dificuldades e ameaças, todos os perigos pesam sobre nosso povo. A solidariedade de classe e a unidade das organizações populares são nossa maior arma para garantir nossa sobrevivência dia após dia, e preparar nossa resposta nas lutas que virão.
Se as vidas dos/das trabalhadores/as forem colocadas em risco, se formos obrigados/as a trabalhar em condições de morte, façamos greves em defesa da vida!–