O Sentimento de Herói Hollywoodiano: EUA contra o Mundo
Por: William de Abreu
Com suas peculiaridades e condições materiais distintas, o Oriente sempre se mostrou um abstracionismo para a ótica Ocidental, desde sua autodeterminação até sua cultura. O conceito de religião, por exemplo, se choca em detrimento das diferentes realidades encontradas entre os divisores de mares, mas a moral católico-cristã detém o monopólio da razão (assim como do poder material) e por isso hegemoniza o discurso dominante. E essa é uma razão kantiana, pois ela não permite a contradição. A contradição é engolida pelo sentimento de parasitismo, corroendo ideologicamente, militarmente, belicamente, cerceado pelo embargo limitante de relações internacionais – assim se apresenta a dominação do Ocidente (lê-se EUA) contra o Oriente.
Antes mesmo da grande virada de caráter nas relações internacionais que se daria na segunda metade do século XX, Lênin já denunciava os interesses do sistema capitalista e suas necessidades em atravessar fronteiras para suprir as demandas do capital nacional, com aquilo que veio categorizar como imperialismo. Monopolizando negociações internacionais, cerceando países e invadindo outros. A geopolítica sempre pareceu um grande balcão de negócios e assim se apresenta nas próprias relações dentro da ONU. A majoritária inclinação aos interesses estadunidenses é escancarada, não podendo esperar qualquer mediação de conflitos sem que esteja sobre influência norte-americana. Foi assim em 2003 que ocorreu no Iraque, por exemplo, quando a invasão dos EUA foi sustentada sobre “ameaça de armas biológicas” em solo Iraquiano.
O Iraque que possui uma rota de transição petrolífera muito importante para o comércio externo, foi submetido ao poderio estadunidense. E esse é um ponto importante para compreender os conflitos atuais, afinal, após quase duas décadas de submissão aos yankees, a economia Iraquiana não vai nada bem, seu comércio está desvalorizado e o poder de negociações internacionais que antes aquecia a economia no Iraque, já não tem mais o mesmo peso. Isso se intensifica em discussões internas pautadas nas divergências de interesses entre o governo Iraquiano e a Casa Branca. Embora o presidente Barham Saleh peça por moderação, em um sentimento conciliador, alguns ministros já falaram abertamente em se preparar para a guerra. O primeiro-ministro do Iraque, Adel Abdel Mahdi, anunciou que o ataque de Trump matou um dos generais iraquianos e líder das milícias populares e que isso é um crime gravíssimo.
“O assassinato de um comandante militar iraquiano que ocupava um posto oficial é uma agressão contra o Iraque, seu Estado, seu governo e seu povo”, afirmou Abdel Mahdi em um comunicado.
Apesar de toda essa mobilização e sentimento por busca de autonomia e soberania nacional frente à imposição estadunidense, as relações entre Iraque e Irã não são nada amistosas. Entretanto, o mais importante é que as nações do Oriente estão, em certa medida, buscando se desvincular das garras imperialistas do Ocidente. Com exceção da Arábia Saudita e Israel que são os fies aliados do EUA, servindo como bucha de canhão nesse combate.
O ataque coordenado por Trump em Bagdá não só foi capaz de assassinar um oficial do Iraque, como também Qassem Soleimani, principal general do Irã. Essas ofensivas estadunidenses não conhecem limites. As intenções dos EUA nesse ataque ainda não estão totalmente expostas. A justificativa é calcada no conflito entre Iraque, Israel e Irã (Arábia Saudita também). Trump acusa os Iranianos de terem atacado a base dos EUA em Bagdá e também outra em Israel. A acusação de que o ataque à base norte-americana em Bagdá seja de autoria do Irã ainda é vaga, por falta provas. A jornalista Emma Fiala, no artigo “No, Iran Didn’t Attack the US Embassy in Baghdad”, sustenta a ideia de que o ataque foi motivado por milícias financiados pelos EUA e sob orientação de Mike Pompeo. Similar com o que ocorre na Síria, com o apoio e por vezes financiamento de terroristas pelo Pentágono para depor o presidente Bashar Al-Assad. Israel aparece quando no final de 2017 foram autores de bombardeios à base do Irã na Síria, intensificando o conflito entre os países, resultando em retaliações e contra-ataque, que os estadunidenses atribuem unilateralmente a culpa ao governo iraniano.
Outros elementos aparecem: há aproximadamente dois meses (Novembro de 2019), o governo iraniano anunciou ao mundo a descoberta de um imenso campo petrolífero. Antes disso o país já ocupava a quinta posição entre os países com maiores reservas de petróleo do mundo. As especulações de que isso tenha motivado o ataque à base iraniana no Iraque são as mais corriqueiras. Mas a motivação do imperialismo estadunidense não é rasa, por puro petróleo e etc. Podemos afirmar que essa descoberta influenciou na posição tomada pelo EUA na ofensiva, mas não só isso; vai mais além dessa questão. A disputa é por hegemonia política, influência econômica, territorial e ideológica.
Uma das principais disputas regionais do Oriente se dá entre Irã e Arábia Saudita. O que difere um país do outro é que o Irã, um país de origem persa, muçulmano xiita, que possui indústrias nacionais, rompendo com as influências dos EUA no país, e apesar do caráter teocrático nas relações, o processo de combate às ações imperialistas dos EUA tomado pelos iranianos deve ser apontado como positivo, pois garantiu a eles a posição de maior soberania nacional. Ao contrário disso, a Arábia Saudita, país árabe, muçulmano sunita, é uma espécie de satélite para os EUA, um país de regime autocrático, que se submete até o último fio de medula ao imperialismo estadunidense. O conflito é marcado não só diretamente como também indiretamente; enquanto o Irã apoia as forças do governo Bashar Al-Assad, na Síria; a Arábia Saudita apoia e financia os grupos “rebeldes” (ou terroristas) contra o presidente sírio.
É preciso ressaltar também que o regime teocrático iraniano não é de caráter antiimperialista, mas sim desobediente. Pois o Irã não detém consciência e nem os passos objetivos em direção ao socialismo, condição indispensável pra efetivar revoluções nacionais antimperialistas. E por essas questões de não possuírem uma orientação consciente de superação do capitalismo, não tem como combater o imperialismo efetivamente e realizar a revolução nacional até às últimas consequências. Se faz necessário esses apontamentos para não deslocarmos o antiimperialismo do socialismo, senão estaríamos caminhando para conclusões do etapismo e não como momentos distintos de uma mesma revolução. E como em todo processo geopolítico, não conseguimos determinar o futuro, só apontar os possíveis caminhos que talvez tomem durante os acontecimentos.
Em busca da hegemonia do império dos EUA, eles instalam milhares de bases militares em volta de todo o Oriente, utilizam Israel e Arábia Saudita como seus bodes expiatórios e até os armam para combater todos aqueles que não se alinhem com os interesses do imperialismo.
Mas o que mais se escancara nisso tudo e deve ser denunciado, é o caráter dos Estados Unidos de não ter pudor em devastar as outras nações. Para, além disso: não reconhecem a soberania dos outros países e se sentirem como verdadeiros combatentes do mal. No sentimento de herói hollywoodiano.
É possível perceber o quão “intocável” podem ser os imperialistas estadunidenses, eles podem cometer a atrocidade de assassinar não apenas civis, tendo um histórico vasto de crimes contra o povo do Oriente, com políticas de extermínio e financiamento de terroristas em áreas estratégicas, promovendo verdadeiros genocídios; e isso, por si só já se demonstra um absurdo tremendo, mas que infelizmente quase passa de forma invisível (tendo em vista que governos anteriores a Trump, como de Barak Obama, foram extremamente mais ofensivos em relação ao Oriente), passando a ganhar destaque ao se lançarem assassinando oficiais de Estado de outra nação sem serem incomodados. Qualquer movimento que ameaçasse alguns centímetros de poder norte-americano pode resultar em guerra, invasão, declaração na ONU, alardeada pela defesa dos direitos humanos e etc. Mas o contrário é feito vista grossa pela comunidade internacional.
É preciso defender a autodeterminação dos povos, sem interferências externas, se opor aos crimes internacionais cometidos pelo imperialismo e cobrar o posicionamento das autoridades internacionais para frear os avanços estadunidenses que não encontra limites ao se lançar na tarefa de correção da contradição capitalista: devastando países terceiros para a manutenção do capital nacional.