SITUAÇÃO NACIONAL PÓS-ELEITORAL
Nota nacional do Polo Comunista Luiz Carlos Prestes, Janeiro de 2015.
Nas eleições de 2014, adotamos o critério de apoiar candidaturas capazes de fortalecer as lutas democráticas, anti-imperialistas e proletárias; comprometidas com a política do Movimento Pró-Frente ou ao menos com valores, bandeiras e referenciais que acumulem força para as lutas do povo no período pós-eleitoral.
Apoiamos a candidatura do PSOL para a Presidência da República, buscando aproximar o conjunto das forças e candidaturas, consequentes, que fazem uma oposição de esquerda ao campo conservador (oposição de direita versus lulismo). Nossa política foi coerente e fizemos o que estava ao nosso alcance. O PSOL dobrou a votação para presidente, é a legenda eleitoralmente mais influente no campo à esquerda. Infelizmente, alheias à necessidade política de unidade do movimento proletário e popular, o campo oposicionista formado pelas legendas partidárias à esquerda (com registro no TSE) apresentou-se fragmentado, com escassa capacidade de responder aos anseios das grandes massas; o que resultou na sua minguada expressão eleitoral: em conjunto 1,7% dos votos válidos.
Foi correto o nosso apoio, no segundo turno das eleições presidenciais, à candidatura de Dilma Rousseff. O PCLCP o fez sem nenhuma ilusão quanto aos programas e governos do PT, que sequer assumem um reformismo democrático e nacional consequente. Apesar das duas candidaturas que polarizaram as eleições integrarem o campo do capital monopolista, elas possuíam importantes diferenças entre si. A “polarização” decorreu do extremismo da direita eleitoralmente aglutinada em torno da candidatura do PSDB, pois a cúpula petista permaneceu passiva, quase totalmente limitada à polêmica em torno da “pequena política”. Identificado com o capital financeiro internalizado, o centrismo petista sequer retoma as tradições desenvolvimentistas da aliança entre industrialistas e trabalhistas pré 1964. No máximo verbaliza fracos matizes reformistas e defende tímidas concessões aos pobres que não toquem nos privilégios dos ricos.
A derrota da candidatura presidencial de Aécio Neves – expressão da direita radical (reunindo setores pró-imperialistas extremados e saudosistas da ditadura militar) – foi uma vitória do povo brasileiro. A direita, porém, superou sua fase defensiva: tornou-se atrevida e ganhou base de massa, inclusive entre a juventude. A renovada agressividade desta direita radical tem características fascistizantes; visceralmente articulada com os interesses do imperialismo estadunidense em busca de: retomar o projeto da ALCA, reverter os avanços populares em toda a América Latina, se apropriar das reservas do Pré-sal e acentuar a privatização da Petrobrás, avançar na privatização do próprio Banco Central. O campo aglutinado em torno da candidatura Aécio é a expressão mais extremada da agressiva ofensiva do grande capital; voltada para eliminar todos os aspectos progressistas da CLT, intensificar a retirada de direitos sociais e revogar a política de elevação do salario mínimo.
Por outro lado, a formação dos Ministérios do segundo governo Dilma, confirma e intensifica o cariz essencialmente conservador dos governos petistas. A nova composição da equipe econômica e o perfil do novo Ministro da Fazenda prenunciam uma política ainda mais subordinada aos interesses exclusivos do capital monopolista. Além dos cortes do orçamento (que incidem principalmente sobre gastos sociais, educação, saúde, etc.) voltados para elevar o superávit primário e pagar a dívida pública, a nova política econômica possui caráter global recessivo e regressivo; com aumento da taxa de juros, retirada de direitos sociais e trabalhistas, “terceirizações”, etc. Por aí o Governo Dilma tende a perder o apoio dos setores populares que garantiram sua vitória eleitoral, erodindo sua legitimidade e tornando sua situação perigosamente vulnerável, a mercê das pressões imperialistas e cativo das chantagens do Congresso Nacional profundamente reacionário.
O PCLCP combaterá frontalmente a ofensiva política e ideológica da extrema direita articulada em torno do PSDB e seus aliados, expressão política dos maiores inimigos do movimento proletário e popular em nosso país.
O PCLCP permanece não só plenamente independente diante do governo e seu campo de apoio, como em frontal oposição às políticas governamentais contrárias aos interesses populares. Neste cenário, reitera que, tanto a resistência contra as políticas regressivas, quanto todas as conquistas democratizantes e transformações estruturais de interesse dos trabalhadores e do povo, dependem da luta autônoma, organizada e unitária das massas.
As esquerdas continuam subestimando tanto a necessidade de elaboração programática, quanto o trabalho de organização e de conscientização das forças populares para levar adiante o processo revolucionário no país.
A via da revolução brasileira, cuja estratégia é socialista, passa pela construção do bloco histórico contra-hegemônico (antimonopolista, anti-imperialista e antilatifundiário), que represente a unidade de amplas forças sociais e políticas em torno de um projeto revolucionário adequado à realidade atual do País. Tal projeto deverá resultar das lutas dos trabalhadores e da sua organização para alcançar objetivos parciais articulados (na medida do possível) com concepções programáticas mais sistematizadas e abrangentes, que possam contribuir para acumulação de forças e a criação de condições – inclusive a formação de partidos políticos revolucionários – para a conquista do poder político, objetivo sem o qual o processo revolucionário ficaria inconcluso e sujeito a novas derrotas.
Considerando o nível de espontaneidade e desorganização em que se encontram os setores populares na atualidade, não nos parece possível, num futuro próximo, a eleição de uma Constituinte, comprometida com os interesses dos trabalhadores. Pior ainda seria uma pseudo-reforma política no âmbito do atual Congresso Nacional, o mais conservador dos últimos tempos, a qual se constituiria certamente numa contrarreforma. Outra questão que está na pauta dos movimentos populares e encontra furiosa resistência do grande capital é a chamada “regulamentação dos meios de comunicação”. Sem dúvida é necessário uma Reforma política democratizante e a democratização dos meios de comunicação. Estas lutas devem ser encaminhadas em conjunto com a luta abrangente por reformas populares e transformações estruturais democratizantes: reforma agrária antilatifundiária, reforma urbana e direito à cidade, reforma tributária com aumento do imposto sobre os lucros das grandes empresas e grandes fortunas e diminuição radical das taxas sobre consumo, com redução (ou isenção) da tributação sobre as rendas provenientes dos salários (assim como dos micronegócios de pequeno-burgueses e autônomos).
O financiamento público exclusivo das campanhas eleitorais seria um avanço. A direita argumenta que isto seria algo “totalitário”, porque ira liberar partidos e candidatos de “convencer as pessoas a aceitar suas opiniões e financiá-los”. Ora, o que ocorre é algo muito distinto. As candidaturas sustentadas por “pessoas” aglutinadas (e mais ou menos organizadas) em tornos de ideais e interesses populares emancipatórios constituem-se hoje em honrosas exceções. A regra é um esquema de financiamento em que não é tanto os candidatos que convencem as grandes empresas a apoiá-los; o grande capital é que viabiliza certas candidaturas com o objetivo de subordinar o Brasil às imposições monopolistas-imperialistas. Ora, quem paga a orquestra escolhe a música: com as campanhas cada vez mais caras, a esmagadora maioria dos eleitos fica refém dos monopólios que os financiam. É uma ilusão acreditar que no capitalismo se conseguirá eliminar o “caixa 2” do financiamento eleitoral pelos monopólios; mas é possível o criminalizar, reprimir e mitigar.
Na medida em que o tema da “reforma política” está em debate, reafirmamos às seguintes propostas do Programa Mínimo aprovado no XII Encontro Nacional do PCLCP no sentido de ampliar a liberdade política e reformar as leis eleitorais e partidárias, explicitando alguns desdobramentos nele baseadas.
Ampliar a liberdade política e reformar as leis eleitorais e partidárias:
– efetiva liberdade de organização de partidos políticos, com direito de apresentação a eleições mediante simples comunicado formal à Justiça Eleitoral, após aquisição de personalidade jurídica por meio de registro em cartório;
– fim da cláusula de barreira e instituição de mandatos eletivos por meio de proporcionalidade direta entre as legendas partidárias;
– financiamento público exclusivo das campanhas eleitorais, com proibição de financiamento privado por pessoas físicas, empresas e entidades;
O modelo brasileiro atual de financiamento de campanha permite tanto a doação individual (pessoa física) quanto empresarial (pessoa jurídica de direito e de capital privados). Por lei é proibido o uso de recursos públicos para financiamento de campanha. Aliás, por lei, seria crime, embora, através das mais diversas formas de corrupção, parte substancial dos recursos das campanhas acabam vindo, de forma ilícita, de fontes públicas. Se, por um lado, os empresários são os grandes doadores de campanha, vale registrar que à organização dos trabalhadores é proibido contribuir financeiramente para campanhas eleitorais, e nisso já reside uma forma de limitar a possibilidade de êxito eleitoral, e mesmo da participação, da classe trabalhadora em relação à classe patronal. Através do financiamento empresarial de campanha, os monopólios acabam por determinar as decisões futuras dos governantes e da representação parlamentar, mesmo quando os recursos disponibilizados são de origem pública, e estas empresas privadas apenas o manipulam: superfaturam contratos inclusive para ter uma sobra para repassar às campanhas eleitorais. Na atual conjuntura brasileira, todos os grandes partidos e a maioria dos pequenos partidos estão plenamente dependentes dessa lógica perversa, que faz das eleições um grande negócio, cada vez mais para o benefício de monopólios privados.
Os setores de esquerda têm defendido o financiamento público de campanha, ou seja, uma determinada quantia de recursos dos impostos iria para financiar a campanha, de todos os candidatos. Alguns defendem o financiamento completamente público, outros, uma modalidade mista, com parte pública e parte privada. Embora exista um quase consenso de que deve ser extinto o financiamento empresarial (embora não o privado individual), tendência impulsionada no momento pelo volume de denúncia de corrupção entre empresas financiadoras de campanha e administradores públicos (governantes e seus cargos de confiança), não é tão provável que esta modalidade venha a ser extinta, pois ela é o coração da atividade lobista de muita gente graúda, que dita regras para governantes e manipula a maior parte dos parlamentares.
Defendemos o financiamento público exclusivo de campanhas, e maior fiscalização para coibir o “caixa dois” que desequilibra de forma esmagadora as campanhas em favor das candidaturas dos partidos, candidatos e programas voltados para os interesses do grande capital.
– correção das distorções na composição da Câmara Federal, implantando-se a proporcionalidade direta entre população e parlamentares a partir da mesma representação básica para os Estados e o DF;
No Brasil, o voto para deputados federais, deputados estaduais e vereadores é proporcional. Ou seja, proporcional ao número de eleitores e proporcional a quantidade de votos que cada partido ou coligação recebe.
A proporcionalidade por número de eleitor em um colégio eleitoral (território, circunscrição) está bastante distorcida no Brasil. Por exemplo: Roraima, com menos de 200 mil eleitores tem oito deputados federais; Santa Catarina, com 4,5 milhões de eleitores, tem 16 deputados federais. Em números proporcionais, se considerar o estado de São Paulo, essa desproporção é ainda maior em prejuízo daquele estado.
Mas a eleição se chama de proporcional porque os eleitos não serão necessariamente os mais votados em geral, e sim os mais votados por partidos que conquistem pelo menos um quociente eleitoral. Um quociente eleitoral é igual ao resultado da divisão do número de votos válidos pelo número de cadeiras a serem preenchidas. O partido ou coligação que não consegue somar número de votos equivalente a um quociente eleitoral não elege ninguém, mesmo que tenha dentre seus candidatos o mais votado dentre todos os candidatos que concorriam àquele cargo, de todos os partidos.
Procede-se da seguinte forma: ao final da votação, verifica-se o número de votos válidos para o cargo proporcional em questão, divide-se pelo número de vagas a ser ocupada e tem-se o quociente eleitoral. Em seguida, apura-se o número de votos de cada partido ou coligação e divide-se pelo quociente eleitoral e a partir disso se chega ao número de vagas a ser ocupada por cada partido ou coligação. Ao final, sempre sobram vagas, em virtude das sobras de cada partido e daqueles partidos que não fizeram quociente. As vagas sobrantes serão preenchidas conforme a maior média de votos por candidato de cada partido ou coligação. Dentro de cada partido ou coligação que atinja quociente eleitoral, evidente, os eleitos serão os mais votados, pela ordem decrescente: primeiro mais votado, segundo mais votado… E assim se forma também a ordem dos suplentes.
– contra o voto distrital (que só reforçaria os “currais eleitorais”); manutenção do voto proporcional para os mandatos parlamentares;
No voto proporcional, os eleitores de todo o estado (ou colégio eleitoral) podem votar em todos os candidatos de todo o estado, independente de qual cidade ou região. E nisso reside a principal diferença do chamado voto distrital.
No voto distrital o colégio eleitoral é delimitado, por região, em cada uma delas se elege um deputado, ou vereador. No voto distrital, desaparece a eleição proporcional, pois mesmo a eleição de deputados e vereadores passaria a ser majoritária. Ou seja, divide-se o colégio eleitoral em vários distritos, e cada distrito passa a ser um novo colégio eleitoral, para eleger um, dois ou três deputados ou vereadores, a depender do tamanho do distrito em relação estado ou ao município.
Os defensores do voto distrital têm como principal argumento o fato de que seria possível à “cidadania” acompanhar melhor e cobrar melhor dos representantes, facilitando até mesmo a cassação do mandato dos que não corresponderem às expectativas. No entanto, o que se pode perceber é que voto distrital anula, ou pelo menos dificulta muito o voto de classe, pois torna a eleição majoritária, favorecendo o candidato do prefeito, ou, na melhor das hipóteses, o candidato do maior partido de oposição ao prefeito. Só em circunstâncias muito especiais, em conjunturas de grande ascensão das lutas populares é que se poderia pensar na eleição de um legítimo e íntegro representante dos trabalhadores e do povo pobre.
Entendemos que o voto distrital é bom para os caciques políticos, para os monopólios que teriam ainda mais possibilidades de evitar a eleição de candidaturas de esquerda, e para que a contestação desapareça ainda mais dos parlamentos, pois os deputados e vereadores não seriam representantes de setores da sociedade, como os sem terra, por exemplo, e sim representantes de regiões. Ou seja, os parlamentares teriam que defender todos os habitantes de uma região, e não uma classe social especificamente, ou setores da classe trabalhadora. A própria legislação colocaria um conjunto de obrigações que anularia qualquer perspectiva de classe social.
– revogabilidade de mandatos executivos, com consulta regular estabelecida em lei;
– proibição das propagandas disfarçadas, limitando-se as campanhas governamentais na mídia a esclarecimentos de utilidade pública sobre serviços estatais;
Estas e outras questões estão em debate quando se fala em reforma política. Entendemos que, por mais que se possa avançar (embora a conjuntura e o atual Congresso Nacional não indiquem avanço, e sim retrocesso), por certo é preciso ser consequente e afirmar que nenhuma reforma política, por si só, poderá trazer avanços substanciais aos explorados e oprimidos. Todos os partidos da ordem estão falando apenas em alterar particularidades no verniz da superestrutura. E estamos falando do Estado brasileiro, autocrático e burguês, dominado até o fim e até o fundo pelos monopólios, pelo latifúndio e pelos diversos tentáculos do imperialismo. Portanto, somos a favor de uma reforma política que amplie as possibilidades de representação das bases da sociedade brasileira, especialmente dos setores explorados e oprimidos, mas não espalhamos a ilusão de que a reforma política possa ser a redenção da sociedade, pois não o será, em nenhum aspecto. Só a luta popular, por seus direitos e por uma nova sociedade, pode criar um conjunto de instituições públicas voltadas para servir à maioria.
Democratizar os meios de comunicação:
No Brasil nove famílias controlam o grosso da Mídia: Marinho (Organizações Globo, associada desde o nascimento ao Grupo estadunidense Time-Life), Civita (Grupo Abril, hoje controlado majoritariamente pelo Grupo Naspers da África do Sul, que foi o principal suporte ideológico do apartheid), Abravanel (SBT), Syrotsky (RBS), Macedo (Record), Saad (Rede Bandeirante), Frias (Folha de São Paulo), Mesquita (O Estado de São Paulo), Levy (Gazeta Mercantil). Todos estes Grupos monopolistas da Mídia são, direta ou indiretamente, articulados com o Instituto Millenium, que funciona como partido orgânico do grande capital (acima das legendas eleitorais). Esta absurda concentração da propriedade da Mídia é um gigantesco aparelho privado a serviço de um padrão de hegemonia autocrática dos monopólios e do imperialismo, instrumento de manipulação, (des)-informação e (in)-comunicação. Avançar na democratização e diversificação na propriedade dos meios de comunicação é fundamental para garantir a efetiva liberdade de expressão; viabilizando formas alternativas ao controle midiático monopolista-imperialista de produzir e difundir conhecimento, informação e cultura. Defendemos:
– fortalecer o sistema público-nacional de imprensa;
– regulamentação dos meios de comunicação, com proibição dos monopólios, garantia de diversificação (pública, comunitária e no máximo 30% empresarial) e limitação de propriedade de um mesmo grupo empresarial a apenas um setor (TV, ou rádio, ou imprensa, etc.) por área territorial;
– revisão das concessões de rádio e TV, de acordo com o interesse público;
– fim do favorecimento político nas grandes das programações;
– eliminação da criminalização das rádios comunitárias e garantias, legais e institucionais, do acesso de movimentos e entidades populares à mídia;
– garantia de acesso gratuito e universal aos benefícios da informática, inclusive à utilização de banda larga, sob regime público.
POLO COMUNISTA LUIZ CARLOS PRESTES, JANEIRO DE 2015.