Após dois anos de processo na Justiça, a historiadora Anita Prestes conseguiu as 319 cartas de seus pais que iriam a leilão
Nesta quinta-feira, 22/10/2020, a historiadora Anita Leocadia Prestes, filha de Olga Benario Prestes e Luiz Carlos Prestes, recebeu as 319 cartas endereçadas ao seu pai por familiares. Depois de 2 anos de luta na Justiça, Anita ganhou o processo. No conjunto de documentos, está uma carta de Olga escrita para Prestes, no período em que esteve presa no Brasil, contando que estava grávida de Anita.
Em novembro de 2018, O Globo revelou a existência deste conjunto de 319 cartas de Luiz Carlos Prestes e Olga Benario Prestes, que foram encontradas no lixo em Copacabana e iriam a leilão, com o lance mínimo de R$ 320 mil no lote, de acordo com Soraia Cals, responsável pelo pregão à época. Ao tomar conhecimento da existência destas cartas, Anita entrou com uma ação na Justiça e obteve vitória em todas as instâncias.
Segundo Anita Prestes, em entrevista ao mesmo jornal, à época, as correspondências foram roubadas da sede do PCB (Partido Comunista Brasileiro) em dois saques que a legenda sofreu entre 1945 e 1947. O primeiro ataque ocorreu logo depois que Getúlio Vargas deixou o governo, no fim do chamado Estado Novo, em outubro de 1945. Já o segundo, quando o partido foi proibido, em maio de 1947.
Conforme reportagem de O Globo nesta quarta-feira (22/10), o comerciante Carlos Otávio Gouvêa Faria, que disse ter comprado a documentação, chegou a recorrer ao Supremo Tribunal Federal contra as decisões do TJ-RJ. No entanto, o ministro Celso de Mello não admitiu o recurso porque analisou que não tinham sido cumpridos todos os requisitos para a apresentação. Desse modo, o mérito nem foi avaliado e a decisão do TJ-RJ de devolver as cartas foi mantida.
Ao receber as cartas, Anita Prestes disse que pretende conversar com o Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro (APERJ) para disponibilizar o material para digitalização, mas a doação do material físico será para a Universidade Federal de São Carlos – que cuida do acervo pessoal de Prestes.
À reportagem de O Globo, Anita falou:
– Acho que é uma vitória importante. Justiça. Era um absurdo não receber essas cartas. A maioria são da minha avó Leocádia e da minha tia Lygia falando de mim. De política nem se podia falar, porque a censura era muito forte.
– Lembro delas lamentando o roubo das cartas do partido. Lamentavam muito. Minha avó escreveu desde 1936 duas vezes por semana até 1943, religiosamente, para meu pai – diz a historiadora, ao citar que já publicou livros com 900 cartas da família, mas sentia falta das cartas da avó.
Ainda segundo Anita, o ótimo estado de conservação dos documentos mostra que as cartas não foram encontradas no lixo como foi mencionado.
– Esse negócio de dizer que acharam no lixo é outro absurdo. As cartas estão em perfeito estado de conservação. A gente vê que elas não foram tocadas e elas foram feitas em um papel fininho de seda, aquilo tá intocado. Está tudo em seus respectivos envelopes. É visível que não estava no lixo. Acredito que estava nas mãos de descendentes desse policial – conta ela, ao citar uma reportagem do GLOBO que investigou a possível participação de Israel Souto, ex-chefe de gabinete de Filinto Muller, no episódio.
A advogada Maria Isabel Tancredo, que defendeu Anita Prestes, lamentou que o caso tenha chegado até o STF para a devolução dos documentos
– É lamentável que o caso precisou chegar até o STF para se tomar a atitude que desde o início deveria ter ocorrido. A Anita queria ter levado essas cartas ainda em novembro de 2018. O que eu mais lamento é que esse processo era desnecessário porque o direito dela como filha era muito claro. Para a Anita, depois de tanto tempo, tantas lutas, mais uma. Acho que deveriam ter honrado a história dela e a história brasileira e devolvido as cartas a quem era de direito, mas para mim foi uma honra e fico feliz que o resultado do processo vai permitir que outros pesquisadores jovens tenham acesso a essas cartas – afirmou a advogada da filha de Prestes, Maria Isabel Tancredo.
Na decisão do Tribunal de Justiça, o relator do caso na 3ª Turma Recursal, juiz Arthur Eduardo Magalhães Ferreira, escreveu que “não se nega que a Recorrida é filha de Luiz Carlos Prestes e Olga Benário como tal, herdeira de ambos, sendo, em relação à segunda, notoriamente a única herdeira em virtude do falecimento de Olga Benário nas prisões do regime nazista”. Segundo ele, “o que está em debate nesta demanda é direito de personalidade dos pais da Recorrida, cujo conteúdo particular foi ressaltado pelos próprios recorrentes ao anunciar o leilão das cartas”.
Outras fontes:
- Filha de Luis Carlos Prestes e Olga Benário recebe de volta cartas dos pais que iam à leilão
- Anita Prestes acaba de receber as cartas do pai, Luiz Carlos, que foram encontradas no lixo
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