24 de maio: uma sacudida na Capital Federal

24 de maio: uma sacudida na Capital Federal

Brasília, a capital brasileira desde 1960, nunca tinha sido palco de uma manifestação tão grande quanto a que ocorreu no dia 24 de maio. Estima-se que cerca de 200 mil pessoas marcharam em direção ao Congresso Nacio-nal, o Palácio do Governo e o Supremo Tribunal Federal, com três consignas claras e unânimes: contra a destrui-ção da previdência social, contra o aniquilamento das leis trabalhistas, Fora Temer e fim do golpe. Foi também a manifestação mais forte de todos os tempos em termos de disposição para a resistência e para a luta. Não por acaso, o golpista Michel Temer acabou assinando um decreto autorizando “o emprego das Forças Armadas para a Garantia da Lei e da Ordem no Distrito Federal”. Segundo o ministro da defesa, a convocação do exército foi uma solicitação do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia. O decreto foi revogado menos de 24 horas depois de editado, até para parar de gerar efeitos negativos contra Temer e contra o presidente da Câmara, ambos empenhados em tentar convencer o mundo de que no Brasil não existe um regime de exceção. Mas vale registrar, contrariando o que a grande Mídia e demais forças articuladas no movimento golpista nos querem fazer crer, que a iniciativa do decreto não foi um ato improvisado de Michel Temer, respondendo a um pedido também apressado de Rodrigo Maia. Não! Um decreto como este só ocorre em momentos cruciais, e, com certeza absoluta, ouvindo os próprios comandantes das forças policiais que estavam atuando na situação e os comandantes das forças armadas que deveriam vir a assumir posições. Alguns correram logo para minimizar o impacto da força do movimento, atribuindo o decreto a “mais um erro” do presidente Temer, e o pedido como um ato exagerado, talvez covarde, do presidente da Câmara. Não temos dúvidas quanto aos muitos erros de Temer e nem quanto a indisfarçável covardia dele e de Rodrigo Maia. Mas esta não é a questão, pois os dois não estiveram sozinhos na tomada de decisão. Certamente os dirigentes das forças de segurança foram ouvidos, antes, durante e depois. Para ser mais claro: o centro do poder político do Brasil tremeu na tarde do dia 24 de maio! As autoridades responsáveis pela segurança de todos os poderes perceberam o que era fácil de ver: a Polícia Militar esteve muito perto de perder o controle da situação, em mais de uma ocasião. A rigor, o controle pretendido pelas forças de segurança (comandante geral da PM e secretário de segurança do Distrito Federal) foi rompido logo no começo da tarde, quando a multidão passou a passos largos pelas barreiras policiais e grades que pretendiam isolar a entrada da Esplanada dos Ministérios, para além da qual pretendiam que só passasse quem tivesse sido revistado. O povo trabalhador brasileiro jogou pelos ares estas grades, e dissolveu o cordão de isolamento feito pela Polícia Militar. E o povo avançou! A obtusidade arrogante das autoridades distritais e federais de Brasília determinou os acontecimentos das seis horas posteriores. Como pessoas supostamente instruídas podem imaginar que vão parar um ato de tamanha dimensão? Como podem propor como razoável revistar 200 mil pessoas em um único local e em algumas horas? Essa foi a provocação do dia, se já não bastasse a provocação de um Congresso votando todas as semanas contra os direitos da classe trabalhadora e o povo pobre. Temer apelou para o art. 142 sobre a “Garantia da Lei e da Ordem”, o mais perverso “resíduo” legislativo do entulho ditatorial, porque o povo esteve prestes a romper as últimas resistências da PM ante as portas do Congresso Nacional mais reacionário da história do Brasil. O fez para mostrar aos seus “patrões” que é “capaz de tudo” para impor as (contra)-reformas que eliminam os parcos direitos conquistados pelo povo trabalhador desde a abolição da escravidão. O Exército Brasileiro foi colocado na rua, mais uma vez, para defender a “ordem” autocrática que interessa aos monopólios capitalistas e ao imperialismo. E, pior que isso, foi usado para ajudar as quadrilhas de salteadores que pretendem destruir as leis e a própria Constituição naquilo que ela interessa ao povo trabalhador deste país. Os verdadeiros vândalos, que destroem os direitos do povo e a soberania nacional, estavam atrás dos cordões de isolamento da PM e sob proteção das Forças Armadas. O povo trabalhador brasileiro, mulheres e homens de todo o vasto território nacional, esteve em Brasília para mostrar sua justa indignação contra um governo golpista e corrupto que está destruindo as principais conquistas de um século de trabalho e de luta da classe trabalhadora brasileira. Eram 200 mil pessoas com a mesma vontade de fazer justiça, arriscando a própria vida. Ocupar o espaço público legislativo, vislumbrado nas duas imensas torres do Congresso Nacional e de tudo o mais que existe em volta e simboliza o poder político que deveria ser do povo e “emanar do povo” como diz a CF. Este era o alvo do protesto de toda a gente que tinha vindo do Brasil inteiro. Peleamos bravamente por mais de seis horas consecutivas, usando principalmente o próprio corpo como escudo. Os órgãos de segurança, desde o início, adotaram ações provocativas. Tentaram evitar o ato “administrativamente”, com o pretexto de “revistar” cada indivíduo da multidão formada pelo povo trabalhador. Usaram sistematicamente da violência física, e até de munição letal, para proteger os crimes legislativos e governamentais dos maiores bandidos do país, que estavam nos palácios, dentro dos ministérios, dentro do Congresso. De nada adiantou ou adiantaria meia dúzia de pelegos tentarem fazer acordos ridículos com os órgãos de repressão para acabar com o protesto. 

O governo golpista esteve prestes a vir abaixo no dia 24 de maio. Foi por isso que Temer, em conluio com os demais gerentes do movi-mento golpista, baixou o decreto autorizando a interven-ção das Forças Armadas em Brasília, como se o povo fosse um inimigo militar. Este grave acontecimento produz lições históricas que não devem ser negligenciadas. Às autoridades estatais (ou às que cultivem com alguma sinceridade valores republicanos) fica a lição de que não devem afrontar e reprimir o povo brasi-leiro para impor leis criminosas e proteger larápios. Às organizações populares, deve ficar a lição da necessidade de confiar mais na força do povo, devem aprender que o povo sempre pode muito mais, e quer muito mais. O povo trabalhador brasileiro lutará até a vitória para manter todos os direitos conquistados e para impor “aos de cima”, queiram eles ou não, a obediência a seus direitos civis e políticos e às suas garantias sociais. A classe trabalhadora avança na formação e elevação de sua consciência de classe quanto ao significado de uma cidadania plena para os espoliados e oprimidos e quanto à necessidade urgente de eliminar o monopólio do poder político estatal pelos representantes do grande capital e do imperialismo. O povo brasileiro está cansado de “democracias de fachada”, de “democracias para as elites” que o exclui. O povo quer o atendimento de suas reivindicações, quer participar das decisões mais importantes para a sua vida e para o futuro do país. Mas, para que o povo possa conquistar e exercer a sua soberania, é preciso que as organizações populares se preparem para avançar na formação do bloco social e político capaz de lhe garantir efetivamente peso e voz na sociedade. Não pode haver nenhum “acordo” com o movimento golpista. As 200 mil pessoas que estavam na manifestação de Brasília no dia 24 de maio são expressão dos interesses da imensa maioria dos 200 milhões de brasileiros. Os trabalhadores e a massa popular estão formando uma posição firme e capaz de passar coletivamente da luta política defensiva (nenhum direito a menos, defesa do pouco que existe de soberania nacional e de liberdades democráticas) para uma luta política ofensiva que alcance objetivos próprios independentes, sem passar pela patronagem dos de cima. Organizar uma nova GREVE GERAL NACIONAL é uma tática essencial do movimento sindical e popular para defender nossos direitos ameaçados, derrubar o GOLPE e anular todas as suas leis e medidas reacionárias. As 200 mil pessoas que protestaram em Brasília no dia 24 e os milhões que lutam contra as políticas golpistas ao longo do último ano não se limitam a reivindicar eleições gerais. Não se limitam à indispensável luta pelo direito usurpado de votar. Defendemos eleições diretas já para escolher quem ocupará a Presidência da República, substituindo o golpista Temer. É necessário, porém, muito mais que isso! Não há dúvidas que a prioridade imediata de nossa luta é derrotar as “reformas” da previdência e trabalhista, reverter a criminosa lei de “terceirização” irrestrita, o congelamento de investimentos públicos na saúde e educação, o aviltamento do ensino médio, etc. Não basta derrubar Temer. Derrotaremos todo o golpe e erradicaremos sua obra nefasta. Nossa vitória será conquistada nas ruas, através da organização a partir das bases, através do uso de nossas formas de luta organizada e massiva: as Greves Gerais, manifestações de protesto, etc. O movimento golpista tenta instaurar um novo regime político antidemocrático para reciclar o bloco de poder dominante no Brasil formado pelo imperialismo, pelos monopólios e pelo latifúndio a eles profundamente associado. Ele é parte integrante de uma ofensiva imperialista na América Latina, que já promoveu golpes de Estado em Honduras, no Paraguai e tenta desestabilizar governos populares progressistas – Venezuela, Equador, Bolívia – e quaisquer governos que não obedeçam plenamente sua agenda ultrarreacionária. O movimento golpista é composto pelas forças mais reacionárias e obscurantistas que pretendem: intensificar a associação dependente do Brasil ao imperialismo; entregar nossas riquezas (petróleo do pré-sal, nióbio, aquífero Guarani, Amazônia, etc.) e todo “território econômico” ao capital estrangeiro e seus sócios internos; liquidar todos os direitos democráticos (não somente políticos, mas também econômico-sociais e culturais) conquistados pelo povo trabalhador. Estas forças reacionárias golpistas pretendem, sobretudo, manter em uma posição subalterna “inalterável” a classe operária, o conjunto do proletariado urbano, os trabalhadores rurais e todo o povo pobre espoliado. Nosso dever é, para além de derrotar o movimento golpista, dar continuidade à luta por uma efetiva democracia para as massas: para que os trabalhadores explorados e todos os setores oprimidos e empobrecidos de nosso povo possam conquistar um “lugar ao sol”, “ser gente” em toda plenitude da palavra (como diziam os movimentos populares de nosso país no inicio do século XX), desfrutar efetivamente de todos os atributos de cidadão, inclusive o de lutar livremente por seus objetivos de classe. Para tanto, devemos avançar na formação de um bloco de forças sociais contra-hegemônicas: antiimperialista, antimonopolista, antilatifundiária. Na formação deste bloco de forças populares é importante a elaboração de um programa mínimo unitário, buscando a resolução dos principais problemas enfrentados pela classe trabalhadora e pelo povo pobre em geral. A maior insuficiência do nosso movimento se apresenta hoje não na baixa participação popular (que tem crescido com rapidez) e nem nas dificuldades para articular nossas táticas de lutas unitárias. A ausência mais grave neste momento é a de um projeto mínimo comum que unifique ainda no campo tático, mas que aponte para uma estratégia de emancipação popular. O problema crucial, a ser enfrentado desde já, durante e após a luta resistência contra o golpe, relaciona-se à necessidade de fortalecer meios de luta mais organizados e eficientes dos trabalhadores e oprimidos e passa por superar a ausência de projeto comum. A ausência de um programa mínimo comum dificulta a superação da dispersão (organizativa, política e ideológica) da classe trabalhadora e das forças populares. Nós do Polo Comunista Luiz Carlos Prestes defendemos que se constitua um bloco popular, composto por forças sociais e políticas contra hegemônicas, capaz de lutar por sua autoemancipação coletiva. Este bloco histórico se formará lutando por objetivos próprios para acabar com a tirania oficial do grande capital, desmantelar a supremacia burguesa (cega aos interesses de outras classes e do Brasil como um todo), e converter o povo trabalhador no pilar da sociedade civil em processo de se democratizar efetivamente, desbarbarizar-se e civilizar-se. É importante que as organizações proletárias e populares se proponham a construir um amplo debate voltado para elaboração de um programa mínimo de soluções para os problemas sociais do Brasil. Para ser um programa para valer (e não algo abstrato) deve responder às questões abrangentes da transformação social e ser pensado como referência para a reorganização do movimento popular em nosso país, conectado ao potencial de luta de classes que a esquerda pode mobilizar. Este programa mínimo precisa partir de elementos tais como:1 – Expandir as liberdades democráticas;2 – Mudar as instituições em benefício das classes populares;3 – Combater os monopólios e o imperialismo para o desenvolvimento com soberania e elevação do nível de vida do povo;4 – Defender e ampliar as conquistas trabalhistas;5 – Eliminar o desemprego, a fome e a miséria;6 – Realizar a reforma urbana;7 – Efetivar a reforma agrária anti-latifundiária;8 – Construir novas relações socioambientais;9 – Garantir o acesso universal à saúde pública, estatal, gratuita e de qualidade;10 – Desmercantilizar e reformar profundamente a educação;11 – Prevenir e garantir a segurança pública, com a desmilitarização da polícia militar;12 – Favorecer o protagonismo popular na cultura;13 – Democratizar os meios de comunicação;14 – Acabar com a autonomia do Banco Central;15 – Fazer a auditoria da dívida pública, com suspensão do pagamento;16 – Orientar a política externa pela soberania nacional, autodeterminação e solidariedade aos povos;17 – Instituir impostos sobre as grandes fortunas e sobre a herança dos ricos; Estes e outros pressupostos precisam e podem fazer parte de um programa mínimo para a reorganização das lutas populares em nosso país. Entendemos como momento essencial para a reorganização o debate deste programa, de forma fraterna e generosa, entre as forças que efetivamente pretendam caminhar para a emancipação popular. A constituição de eixos unitários de um programa conectado a um projeto de transformação social abrangente será uma contribuição fundamental para a superação da dispersão política atual e para o próprio desenvolvimento de táticas de luta com maiores chances de êxito. Estamos à disposição para realizar este debate com todas as organizações populares do campo democrático e de esquerda. Nós do Polo Comunista Luiz Carlos Prestes nos solidarizamos com todas as vítimas da violência policial do último dia 24 de maio, assim como com as famílias das pessoas que seguem internadas, pelo menos uma com risco de morte. Há um aprofundamento da repressão do Estado, que intensifica a violência e repressão no campo e na cidade, exemplo disso: um ano de governo golpista houve chacinas, no Paraná, Mato Grosso do Sul, dos indígenas no Maranhão e no próprio dia 24, o assassinato de pelo menos 10 trabalhadores sem terra no Pará. Temos claro que a luta precisa ser ampliada e aprofundada. Uma nova e maior Greve Geral é um clamor das bases populares, necessária para derrotar as políticas do movimento golpista. É necessário que as centrais sindicais definam a convocação de uma nova Greve Geral, e que esta não seja apenas “mais um dia”. A segunda Greve Geral precisa e pode ser maior, mais ampla e mais radical. A defesa da aposentadoria e demais direitos previdenciários; a defesa dos direitos trabalhistas; a luta contra a terceirização irrestrita; a defesa dos serviços, do patrimônio e das riquezas naturais do Brasil, que é uma luta contra todas as forças de privatização; a luta contra o Golpe, como legítima defesa do povo brasileiro; a luta contra as eleições indiretas, defendendo o direito do povo brasileiro de eleger diretamente seu governo. A Greve Geral será uma ferramenta da luta de resistência contra as políticas do movimento golpista que ameaçam liquidar nossos direitos, nossas liberdades e a soberania nacional. A articulação da luta de resistência com a construção do bloco popular, em conexão com a elaboração de um programa mínimo popular, possibilitará ao nosso movimento sair da defensiva e construir uma vontade coletiva para impor os direitos “dos de baixo” às classes dominantes e avançar, no momento subsequente, para a desagregação da ordem e do Estado autocrático imposto pelo atual bloco de poder imperialista-monopolista. A luta ampla e unitária de ofensiva contra o projeto golpista imposto pelo imperialismo deve conectar-se desde já à luta prolongada em direção à transformação do atual campo popular em bloco histórico e à conquista de um poder que abra caminho para o socialismo.27 de maio de 2017.

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